sexta-feira, 11 de abril de 2008

Roberto Carlos, intérprete - 21h



Olá, amigos.

No último post deste recorte da discografia de Roberto Carlos, batizado de Roberto Carlos, intérprete, mostramos aqui como sua discografia vem sendo uma fonte de repertório para os artistas até os dias de hoje. Esta constância atingiu inclusive às faixas de horário dedicadas à teledramaturgia na TV Globo, há décadas a maior fabricante de novelas brasileiras.

Músicas originalmente gravadas por Roberto Carlos vêm sendo usadas na trilha musical das produções da emissora do Jardim Botânico - nos posts anteriores, vimos Sonho lindo (gravada por RC em 1973), cantada por Tânia Mara e presente em Desejo proibido, e Coisas do coração (lançada por RC em 1987), na gravação de José Augusto que está entre as canções de Beleza pura.

O horário das 21h também abriu espaço a leituras mais recentes de músicas da safra de RC. E, assim como no título da novela, o "Roberto Carlos intérprete" aparece em dose dupla.

Vindo de um sucesso no horário nobre (Senhora do destino, no ar entre 2004 e 2005), o autor Aguinaldo Silva recebeu a incumbência de escrever uma nova sinopse para entrar no ar no fim de 2007 - mas, apesar do "hiato" entre as datas, as sinopses costumam ser entregues com antecedência de mais de um ano. Uma jogada de risco, uma grande armadilha pela qual ele passou anteriormente e já não teve muito sucesso na década anterior - quando escreveu o sucesso A indomada, em 1997, e depois teve um fracasso retumbante com Suave veneno, em 1999 - explicado por Aguinaldo como "fase de ameixa sêca" (momento em que perdeu completamente a inspiração para escrever).

Em sua nova empreitada, o autor lançou a partir de primeiro de outubro de 2007 a história de Duas caras - expressão que, no gosto popular, serve como referência para dizer que uma pessoa é cínica, hipócrita. E que, no caso do protagonista de sua novela, acabaria também sendo levada ao pé da letra.

A trama começou quando Adalberto Rangel (vivido por Dalton Vigh) presenciava um acidente de carro numa região do sul do país. O casal morto (Waldemar e Gabriela Nascimento, participações especiais de Fúlvio Stefanini e Bia Seidl, respectivamente) trazia uma pasta com dólares e a foto de uma moça - Maria Paula (papel de estréia como protagonista da atriz Marjorie Estiano).

Em Passaredo (cidade fictícia localizada no estado do Paraná), Maria Paula recebia a notícia de que estava órfã através do desconhecido. Adalberto aproveitava a fragilidade da moça para seduzi-la, e depois fugia com todo o dinheiro da família.

Os anos se passavam, e Adalberto, após várias cirurgias plásticas, mudava de rosto e também de identidade: agora era Marcôni Ferraço, dono de uma grande construtora no Rio de Janeiro. Um de seus empregados, Juvenal Antena (ótima atuação de Antônio Fagundes), se opunha às atitudes da construtora com relação aos subalternos, e inflava uma revolta para que os antigos empregados tivessem direito à moradia. Ele se tornava o líder de uma região conhecida como "favela da Portelinha".

Enquanto isto, Maria Paula traçava um plano obsessivo de encontrar o homem que a deixou na miséria. Com a ajuda do advogado Claudius (interpretado por Caco Ciocler), homem apaixonado por ela desde que moravam em Passaredo, ela seguia primeiro rumo a São Paulo, até chegar ao Rio de Janeiro, trazendo um trunfo: o filho Renato (estréia de Gabriel Sequeira). A trama tecida por Aguinaldo tem um mérito: seus núcleos dão margem a várias situações, e há como abordar assuntos em evidência atualmente na realidade nacional.

Na favela da Portelinha, além da expansão urbana, o autor deu margem para apresentar como pessoas de diferentes histórias e diferentes formas de viver convivem entre si. O caso mais latente foi a convivência entre adeptos do candomblé (liderados por Dona Setembrina, vivida por Chica Xavier) e a igreja protestante (tendo o pastor Inácio Lisboa, ótima construção de Ricardo Blat).

Entretanto, esta trama se perdeu depois que Aguinaldo decidiu que a Portelinha seria invadida por traficantes armados. A matança atingiu Rebeca, a filha do pastor (sensível atuação de Paola Crosara), com uma bala perdida. Após a morte de Setembrina e de Rebeca na "invasão" e do desaparecimento do pastor Lisboa, o mérito de mostrar a igreja protestante sem estereótipos (e convivendo em paz com umbandistas) foi deixado de lado: ganhou destaque a personagem Edivânia (vivida por Susana Ribeiro) e seu grande fanatismo religioso. O tom de Edivânia vem recebendo protestos por parte de seguidores das religiões protestantes - que afirmam que a personagem infla ainda mais o repúdio aos evangélicos. Talvez na tentativa de amenizar esta situação, o autor vem dando destaque a Ezequiel (vivido por um grande ator chamado Flávio Bauraqui), que seria um evangélico "inofensivo" aos olhos do público.

O público e a Portaria 796 (que classifica a censura das atrações exibidas na televisão) fizeram com que Aguinaldo Silva mudasse outra trama. Ainda na favela havia a "Uisqueria", lugar de prostituição velada na qual a personagem Alzira (papel de Flávia Alessandra) dançava para o deleite do público masculino - ela escondia a profissão do marido Dorgival (interpretado por Ângelo Antônio), portador de uma doença rara no coração que só poderia ser tratada em uma operação muito delicada. Aguinaldo causou um incêndio na "Uisqueria" e a transformou num bar mais comportado - o "Texas Bar", com as prostitutas se tornando dançarinas e passando a fazer parte de outras situações. De maneira irônica, o autor também incluiu um personagem intrigante - o "Sufocador de Piranhas", misteriosa pessoa que ataca as mulheres que trabalham no local sempre quando elas passam pela região mais deserta da favela. Embora tenha o mérito da ironia, este personagem se assemelha demais com outros "mistérios" de novelas anteriores de Aguinaldo Silva - a "Mulher de Branco" de Tieta e o "Cadeirudo" de A indomada .

Um dado curioso que justifica a frase "novela das oito que começa às nove": para que as novelas discutam temas mais polêmicos, elas atualmente vêm sendo obrigadas a proibir a atração "para menores de 14 anos". Esta classificação torna obrigatório que elas comecem depois das 21h. Enquanto Duas caras foi considerada "proibida para menores de 12 anos", ela começava no horário das 20h55. Em virtude destas mudanças, atualmente a TV Globo não tem mais reprisado novelas de seu horário de maior audiência: muitas coisas não devem ser apresentadas no horário da tarde, em que se apresenta o Vale a pena ver de novo - programa dedicado à reapresentação de novelas bem sucedidas na emissora. Desde segunda-feira, está indo ao ar a reprise de Cabocla, exibida originalmente às 18h.

Outra questão abordada pelo dramaturgo é o cotidiano de uma universidade. Trata-se da Universidade Pessoa de Moraes, e todos os fatos que se passam em uma faculdade. Desde Branca (vivida por Suzana Vieira), esposa do antigo dono que, de uma hora para outra se via diante de ocupar um cargo tão importante, passando por uma pessoa que trabalha lá há anos e aguarda ansiosamente por sua nomeação para a reitoria da faculdade (Heriberto, vivido por Paulo Goulart), o corpo docente e os alunos (dentre eles, o engajado Rudolf criado por Diogo Almeida e a "menina prodígio" Ramona, feita por Marcela Barrozo). Ainda há a figura de Francisco Macieira (papel a cargo de José Wilker), um homem que participou de movimentos estudantis durante a Ditadura Militar e que, depois de um bom período morando na França, retornava para assumir a reitoria da faculdade.

Outras tramas interessantes são o casal cômico Gabriel e Maria Eva (feitos por Oscar Magrini e Letícia Spiller, respectivamente), o "triângulo amoroso" que vive em harmonia Bernardinho, Dália e Heraldo (respectivamente interpretados por Thiago Mendonça, Leona Cavalli e Alexandre Slaviero)e a figura do deputado Narciso (vivido por Marcos Winter), um deputado honesto. Também é abordada a luta contra o alcoolismo, através do personagem Zé da Feira (músico interpretado por Eri Johson). A parte cômica ficou mais enfraquecida com a saída da personagem Amara, pois a atriz que a interpretava, Mara Manzan, teve de se afastar por motivos de saúde.

O leque de criações de Aguinaldo Silva parece trazer boas opções. Entretanto, o desenvolvimento de Duas caras vem trazendo muitas falhas - em virtude do autor ou do público? Esta questão sempre permanece...

A começar pelo protagonista "duas caras". Após ser apresentado com uma faceta inescrupulosa, aos poucos parece que Ferraço vem recebendo doses de "bondade", se tornando um improvável bom moço (dubiedade difere de incoerência). Os capítulos passam, e Maria Paula prossegue sendo uma das mocinhas mais insuportáveis da história da teledramaturgia brasileira - ela só sabe chorar e se lamentar, além da fragilidade cada vez ficar maior (o ideal seria deixá-la mais fortalecida com as "pancadas" sofridas - e ela iria da inocência dos primeiros capítulos, passando por suas quedas constantes, até chegar à redenção).

A discografia do "Roberto Carlos intérprete" aparece através de duas histórias apresentadas em Duas caras. E, infelizmente, ambas pecam pela falta de originalidade do autor.

Quinta faixa do LP de 1966, a música que é tema do personagem Evilásio (vivido por Lázaro Ramos) renasceu cerca de 40 anos depois na voz de MC Leozinho - e a gravação da música foi sugerida ao cantor de funk pelo próprio RC (que ficou fascinado ao ouvir sua música no rádio e o convidou para, em seu Roberto Carlos Especial de 2006, os dois cantarem a música Se ela dança, eu danço). O envolvimento do "favelado" Evilásio com a "rica" Júlia (papel de Débora Falabella) tinha rendido uma das tramas de Senhora do destino: Maria Eduarda (também vivida por Débora Falabella) se apaixonava por um suburbano - Viriato (interpretado por Marcello Antony) e recebia o repúdio do pai. Em Duas caras, a não aceitação do pai de Júlia fica mais acentuada pelo fato de ele ser negro.

O personagem de Lázaro Ramos também está envolvido em outra trama. Ele, que é afilhado de Juvenal Antena, se voltou contra os desmandos do padrinho e se prepara para ser candidato a vereador. Um "conflito ideológico" na favela da Portelinha.

O segundo momento em que a obra de Roberto Carlos como intérprete aparece vem através de uma outra cantora em evidência atualmente: Isabela Taviani. Ela interpreta uma música gravada por RC em seu LP de 1977 e que é uma das músicas mais importantes do repertório de Wanderléa para ser o tema de Célia Mara (vivida por Renata Sorrah).

Célia tinha, há décadas, um caso extraconjugal com João Pedro (participação especial de Herson Capri), marido de Branca e dono da Pessoa de Moraes. Em um dia que ela foi com amante a um circo, acontecia um tiroteio nas imediações do local, e ele era fulminado por uma bala perdida, morrendo na hora. Através dos jornais, Branca sabia da traição, e as duas passavam a se confrontar constantemente - inclusive depois que se descobria que Clarissa (vivida por Bárbara Borges) era filha de João Pedro, portanto, dona de metade do patrimônio universidade. A filha passava os direitos à mãe, que também se tornava uma das acionistas da Pessoa de Moraes. E, com esta trama, Aguinaldo Silva se repetia não na história, mas na escalação de seu elenco: assim como três anos antes, em Senhora do destino, Suzana Vieira e Renata Sorrah entram em conflito no horário nobre da TV Globo.

Alheio aos deméritos ou aos méritos que passam no horário das 21h, Roberto Carlos novamente se apresenta na trilha da novela de maior audiência na grade da TV Globo - através de dois momentos e de novas interpretações de canções que ele apresentou ao grande público. Como um negro gato, Roberto arrepia apresentando toda a ternura necessária para comover espectadores e ouvintes de boa música.

E esta série sai do ar deixando vocês com duas letras campeãs de audiência. Na foto, o logotipo de Duas caras.

NEGRO GATO - Getúlio Côrtes

Eu sou o negro gato de arrepiar
E essa minha vida é mesmo de amargar
Só mesmo de um telhado
Aos outros desacato

Eu sou o negro gato...
Eu sou o negro gato...

Minha triste história vou lhes contar
E depois de ouví-la sei que vão chorar
Há tempos eu não sei o que é um bom prato
Eu sou o negro gato...

Sete vidas tenho para viver
Sete chances tenho para vencer
Mas se eu não comer, acabo num buraco
Eu sou o negro gato...

Um dia lá no morro, pobre de mim
Queriam minha pele para tamborim
Apavorado, desapareci no mato
Eu sou o negro gato...

Eu sou o negro gato...
Eu sou o negro gato...

***
TERNURA (Somehow it got to be tomorrow) - Estelle Levitt e Kenny Karen (versão de Rossini Pinto)

Uma vez você falou
Que era meu o seu amor
E ninguém ia separar
Você de mim

Agora você vem dizendo adeus
Que foi que eu fiz
Pra que você
Me trate assim

Todo amor que eu guardei
A você eu entreguei
Eu não suporto
Tanta dor, tanto sofrer

Agora você vem dizendo adeus
Que foi que eu fiz
Pra que você
Me trate assim

Toda ternura que eu lhe dei
Ninguém no mundo vai lhe ofertar
E seus cabelos só eu sei
Como afagar

O meu pobre coração
Já não quer mais ilusão
Já não suporta mais sofrer
Ingratidão

Agora você vem dizendo adeus
Que foi que eu fiz
Pra que você
Me trate assim...

5 comentários:

Rosangela Amorim disse...

Eu não assisto novelas, mas adorei a matéria!
E essas canções são maravilhosas!!!
Obrigado por passar no meu flog!
Beijos!!!

Rosangela Amorim / BH

Unknown disse...

Canções lindas presentes em novelas...filmes..Nosso Rei é inspiração à muitas pessoas.
Na minha vida, ele faz parte todos os dias, com suas canções.

Derbson Frota disse...

Nosso amigo Vinicius mostra que é um cara noveleiro, hein?rsrsr. Realmente nos últimos anos muitas músicas do repertório do rei estão presentes nas trilhas sonoras das novelas globais. E,particularmente, curto muito esse fato...

Derbson

Anônimo disse...

Esse tipo de matéria é bacana, Vina. Adorei, super bem feita, e, como disse o Derbson, vc se mostra bem noveleiro, né??? hehehehe

Abração, bicho
James
www.rcbraga.vai.la

Anônimo disse...

Rapaz, essa é a única novela que tenho assistido. Achei bacana a gravação do Leozinho e emocionante a gravação da Isabela!

Curioso é que todas as músicas do Roberto, quando interpretadas por outras pessoas nos dão uma saudade maior do rei!

Blog Música do Brasil
www.everaldofarias.blogspot.com

Um forte abraço!