sábado, 31 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 9



Olá, amigos.

Prosseguindo a série Casa, esquinas e quintais, mostramos hoje mais uma canção da discografia de Roberto Carlos que fala sobre algumas situações que acontecem dentro de um lar. A música de hoje tem em comum com a do post anterior (Por motivo de força maior, de 1976) o fato de sua letra mostrar um panorama completo da casa.

Para evidenciar a grandiosidade das situações narradas durante a letra, Roberto e Erasmo usaram uma figura de linguagem que é mais apropriada às ruas de uma cidade. As ESQUINAS, que são lugares que ficam nos cantos formados por duas ou mais ruas que se cruzam, aparecem nesse lar cantado por RC.

O título foi o primeiro passo para uma canção que faz associação da intimidade de um casal com situações que costumam acontecer no trânsito da cidade. Em casa, os limites são passados na busca de um abraço, as paradas são para um carinho no corredor e o destino é o local dos amantes - o quarto.

Na música que abre o lado B do LP que lançou em 1985, Roberto Carlos cantou o trajeto de um amor que chega junto ao destino de uma deliciosa vida a dois. Para o homem que outrora parava o carro na contramão, nada melhor do que nas esquinas de casa não precisar ficar atento a leis e nem sinais.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos em um registro da segunda metade da década de 1980.

Abraços a todos, Vinícius.

PELAS ESQUINAS DA NOSSA CASA - Roberto e Erasmo

Abro a porta sem cuidado, como todo apaixonado
Vou correndo pra você
E no nosso encontro eu passo dos limites nesse abraço
Deixo tudo acontecer

A aceleração é louca quando beijo a sua boca
Me dispara o coração
Nosso corpo se resvala sem controle pela sala
Que loucura, que paixão

Com você
Nesse trânsito eu vou mais
Nas esquinas dessa casa
Não têm leis e nem sinais

Vamos nós nesse carinho, mas paramos no caminho
Dessa vez no corredor
Mãos e abraços que doçura, mais abaixo ou na cintura
Tudo é sempre sedutor

Tantos beijos e carícias, tantas curvas e delícias
Mais palavras, mais calor
E chegamos ofegantes ao destino dos amantes
Nosso quarto, nosso amor

Com você
Nesse trânsito eu vou mais
Nas esquinas dessa casa
Não têm leis e nem sinais...

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 8



Olá, amigos.

A série Casa, esquinas e quintais continua a apresentar neste blogue canções da discografia de Roberto Carlos que mostram partes de um lar. E a música de hoje é uma das que traz uma visão panorâmica e amargurada sobre os momentos vividos dentro de casa.

Afinal, quando ela deixa de ser o sinônimo do conforto e a garantia de ser um lugar para viver, vêm apenas as lembranças de momentos bons deixados para trás. E, ao aparecerem novamente na memória de uma pessoa, trazem o desenrolar de uma história que chegou ao fim, algumas vezes, de maneira melancólica.

Esta canção que encerra o LP de 1976 é até o momento a mais recente música que RC gravou de autoria de Getúlio Côrtes - compositor muito associado à época da Jovem Guarda na discografia de Roberto, em especial por ter escrito canções em linguagem próxima de narração de histórias em quadrinhos, como Pega ladrão, O sósia e O feio. Getúlio só apareceu de maneira "mais recente" no disco lançado em 1995, quando foi feita uma nova leitura de Quase fui lhe procurar (gravada originalmente em 1968, no LP O inimitável), e também na inclusão da emblemática Negro gato (do LP de 1966) em seus shows, apresentada por RC como um "sinal de que a terapia tá dando certo".

Dez anos depois de dar voz às desventuras do negro gato que tem uma vida de amargar, Roberto cantou um novo enfoque do repertório de Getúlio Côrtes. Uma canção mais madura, falando das nostalgias que se tem quando passa por cômodos que hoje não fazem mais parte do cotidiano de alguém - e que, por motivo de força maior, hoje aparecem apenas na lembrança. E como lembrança musical, hoje este blogue apresenta uma música não muito lembrada na discografia de Roberto Carlos, mas que merece toda nossa consideração com o grande "negro gato" Getúlio Côrtes.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos em um número presente no DVD Antologia apresentado no ano em que gravou a música com a qual encerramos o post de hoje.

Abraços a todos, Vinícius.

POR MOTIVO DE FORÇA MAIOR - Getúlio Côrtes

Então cheguei sozinho e quis rever a nossa casa
O desalinho dos cabelos disfarcei
O muro mal pintado, algumas flores escondidas
Degraus empoeirados, a varanda esquecida

No meio de uma sala, o tapete
No fim do corredor, a porta do nosso quarto que guardava
Antigas frases e atitudes inseguras
Todos os erros, os nossos gestos incontidos
Seus apuros e segredos

Depois de tanto tempo
Eu lhe encontro se escondendo
Atrás de frases repetidas pra justificar
A sua decisão de separar as nossas vidas
Por isso acomodei, sem ter razão pra contornar

Você se fez senhora
Somente por respeito e por escrito
Mas fica o dito por não dito
E as suas mágoas eu respeito

Mas não aceito o argumento
De que agora se arrepende
E por motivo de força maior
É melhor partir

Se alguém me acompanha
Deve saber
Que às vezes só ganha
Quem sabe perder

Depois de tanto tempo
Eu lhe encontro se escondendo
Atrás de frases repetidas pra justificar
A sua decisão de separar as nossas vidas
Por isso acomodei, sem ter razão pra contornar

Você se fez senhora
Somente por respeito e por escrito
Mas fica o dito por não dito
E as suas mágoas eu respeito

Mas não aceito o argumento
De que agora se arrepende
E por motivo de força maior
É melhor partir

Se alguém me acompanha deve saber
Que às vezes só ganha quem sabe perder...

terça-feira, 27 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 7



Olá, amigos.

A série Casa, esquinas e quintais prossegue contando em letra e música trechos da discografia de Roberto Carlos que falam sobre partes de um lar. E hoje chegamos a uma parte de casa na qual, através dela, somos espectadores do resto do mundo.

A JANELA, definida no Dicionário Aurélio como a abertura da parede para deixar entrar num edifício a luz e o ar, aparece em situações interessantes no cancioneiro gravado por RC. Trata-se, inclusive, de um objeto mencionado em todas as décadas de sua discografia.

O primeiro momento vem ainda no LP É proibido fumar, de 1964, quando ele recomenda que as janelas estejam fechadas para evitar que o leão à solta não se torne um vizinho indesejável na música Um leão está solto nas ruas, assinada por Rossini Pinto. Quatro anos depois, na canção Madrasta, de Beto Ruschel e Renato Teixeira (do LP O inimitável), ele avisava à "bem vinda" madrasta que o vale verde se dá por trás das janelas de sua casa e de seu pai.

Das janelas cantadas por RC também pode-se ver as muitas flores e sua mãe dizendo num sorriso e na lágrima o aviso de ter cuidado na partida pro futuro, na sincera O divã (do LP lançado em 1972). A menina, botão em flor se abrindo para conhecer o primeiro amor nos versos de A menina e o poeta (surpreendente canção assinada por Wando, do disco de 1976), o "broto" Susie (primeira canção que Roberto assinou e gravou, ainda para o compacto de 1959) ou o rosto da mulher que vira sua cabeça dos versos de Obsessão (presente no LP de 1993).

As janelas se abrem para a chegada de quem estava num exílio voluntário ou não e retorna para seus pés tocarem a areia branca. Elas foram algumas das partes que Roberto e Erasmo usaram para homenagear Caetano Veloso na época de seu exílio em Londres, na letra de Debaixo dos caracóis dos seus cabelos, lançada no emblemático LP de 1971.

Na janela vêm muitos sentimentos, desde a certeza do cotidiano presente em Rotina (última faixa do LP de 1973), na qual ele imagina a água morna do chuveiro deslizando no corpo da esposa e respingando gotas coloridas no vidro, até ser o lugar por onde uma pessoa religiosa olha o céu e encontra a presença de Jesus (como mostra Jesus Salvador, do LP de 1994). Das frestas da janela podem exalar o amor extremo de Tudo pára (de 1981) e o frio da solidão de Você já me esqueceu (de autoria de Fred Jorge, e gravada por RC em 1972). E é pelas vidraças que um abandonado consegue transmitir o tanto que sofreu pela espera de quem sempre achou que voltava, como dizem os versos de Ivor Lancellotti para a bela música Abandono, gravada por Roberto em 1979.

Mas dentre todas as janelas escritas ou gravadas por Roberto Carlos, certamente a mais emblemática vem do ano de 1972. Nos versos de Roberto e Erasmo que abrem o disco daquele ano, ela é a personagem-título e a metáfora que separa a segurança de casa da liberdade do horizonte de uma estrada.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos em show da década de 1970.

Abraços a todos, Vinícius.

À JANELA - Roberto e Erasmo

Da janela o horizonte
A liberdade de uma estrada eu posso ver
O meu pensamento voa livre em sonhos
Pra longe de onde estou

Eu às vezes penso até onde essa estrada
Pode levar alguém
Tanta gente já se arrependeu e eu
Eu vou pensar, eu vou pensar

Quantas vezes eu pensei sair de casa
Mas eu desisti
Pois eu sei lá fora eu não teria
O que eu tenho agora aqui

Meu pai me dá conselhos
Minha mãe vive falando sem saber
Que eu tenho meus problemas
E que às vezes só eu posso resolver

Coisas da vida...
Choque de opiniões...
Coisas da vida...
Coisas da vida...

Novamente eu penso ir embora
Viver a vida que eu quiser
Caminhar no mundo enfrentando
Qualquer coisa que vier

Penso andar sem rumo
Pelas ruas, pela noite sem pensar
No que vou dizer em casa
Nem satisfações a dar

Coisas da vida...
Choque de opiniões...
Coisas da vida...
Coisas da vida...

Penso duas vezes me convenço
Que aqui é o meu lugar
Lá fora às vezes chove
E é quase certo que eu vou querer voltar

A noite é sempre fria
Quando não se tem um teto com amor
E esse amor eu tenho mas me esqueço
Às vezes de lhe dar valor

Coisas da vida...
Choque de opiniões...
Coisas da vida...
Coisas da vida...

Tudo tem seu tempo
E uma vida inteira eu tenho pra viver
E nessa vida é necessário a gente
Procurar compreender

Coisas que aborrecem
Muitas vezes acontecem por amor
E esse amor eu tenho esquecido às vezes
De lhe dar valor

Coisas da vida...
Choque de opiniões...
Coisas da vida...
Coisas da vida...

domingo, 25 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 6




Olá, amigos.

A série Casa, esquinas e quintais continua a procurar na discografia de Roberto Carlos canções que falam sobre partes de um lar. E depois de atravessar a porta no post anterior, hoje começamos a reparar alguns detalhes de dentro de casa.

A começar pelas PAREDES. A parede é uma obra que serve como limitação de um espaço, vedando o ponto de vista do exterior sobre uma casa ou um quarto.

Elas aparecem no repertório de RC como demonstração de intimidade de um casal. Na canção O amor é a moda, que abre o LP de 1983, Roberto e Erasmo revelam a certeza de que os casais fazem com que o amor esteja sempre na moda quando estão "pelos cantos escuros das ruas e entre quatro paredes bem mais".

Mas as paredes se fazem mais presentes em seu repertório com outras conotações: a de abrigar um desiludido amoroso e também transmitir a certeza de que tudo está terminado. No samba Só você não sabe (de 1989), a dor da solidão fica tão forte a ponto de quando está em casa ficar só no quarto e falar com as paredes.

Em Comentários (de Maurício Duboc e Carlos Colla e presente no LP de 1976), o final de um relacionamento vem com o apelo para que o que houve "entre quatro paredes" não seja revelado a outras pessoas, pois, como dizem os primeiros versos da canção: "eu só quero pedir pra você evitar comentários". Já na raivosa Jogo de damas, parceria dos irmãos Isolda e Milton Carlos gravada no LP de 1974, os segredos da dama que hoje "vestem de santa" correm o risco de vir à tona, e ficam mais fortes quando RC canta, de maneira calmamente ameaçadora: "conheço as paredes que guardavam segredos". Enquanto isso, o lamento de Recordações (assinada por Édson Ribeiro e Helena dos Santos para o LP de 1982), a falta que a pessoa faz se torna mais forte quando se vê ao redor "paredes nuas e lembranças que são suas".


A parede também está em uma canção apresentada anteriormente. Nos versos de O portão, de 1974, RC torna a nostalgia ainda mais forte por causa da parede que traz seu retrato "meio amarelado pelo tempo". Seu disco de 1989 trouxe espaço para falar de paredes conhecidas internacionalmente: naquele ano, ele deu sua versão para o clássico português Nem às paredes confesso, de Maximiano de Souza, Francisco Trindade e Artur Ribeiro, nos belos e eternos versos "de quem eu gosto nem às paredes confesso".

Entretanto, nenhuma canção é tão forte quanto a que ele lançou em seu LP de 1975. Nos versos de Beto Ruschel e Cézar das Mercês, Roberto revelou aos seus ouvintes a história de uma moça que se fechava em seu quarto de dormir e sua imaginação apresentava de noite desenhos na parede. Talvez em uma das melhores interpretações de sua discografia, a misteriosa menina que via desenhos na parede do quarto teve seus sonhos desenhados em belíssimas letra e música que merecem ser descobertas.

Segue a letra! Na foto, uma parte da contracapa do disco lançado em 1975.

Abraços a todos, Vinícius.

DESENHOS NA PAREDE - Beto Ruschel e Cézar das Mercês

Ela se fechava
No seu quarto de dormir
Como uma flor
Se guardando para o sol

E dos seus sonhos, acordava no meio da noite
E cada sombra na parede desenhava alguém
Que chegaria com as primeiras luzes da manhã
Sempre a manhã

E cada sombra na parede desenhava alguém
Que chegaria com as primeiras luzes da manhã...

E dos seus sonhos acordava no meio da noite
E cada sombra na parede desenhava alguém
Que chegaria com as primeiras luzes da manhã
Sempre a manhã

E cada sombra na parede desenhava alguém
Que chegaria com as primeiras luzes da manhã...

E cada sombra na parede desenhava alguém
Que chegaria com as primeiras luzes da manhã...

Quando a luz do sol
Lentamente aparecer
Só irá mostrar
Cada coisa em seu lugar...

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 5




Olá, amigos.

A série Casa, esquinas e quintais continua a apresentar canções da discografia de Roberto Carlos que falam sobre objetos presentes em uma casa. E no post de hoje, enfim adentramos no lar das canções que RC escreveu (sozinho ou com Erasmo)e/ou somente interpretou.

A PORTA, abertura na parede que fica ao nível do solo ou de um pavimento aparece de maneira extensa na discografia de RC. Na metáfora presente na casa de portas abertas para a amizade de Amigo (de 1977) ou na porta entreaberta de um coração conquistado de forma inocente em Não se afaste de mim (de 1980). Também aparece como o objeto que proporciona a privacidade do casal, que, ao fechar a porta pode se amar como aparece nos versos de Porque a gente se ama (de 1990), Procura-se (esta, de Roberto Carlos e Ronaldo Bôscoli lançada em 1980) ou Quando a gente ama (gravada em 1994), dentre tantas outras canções sensuais.

Mas dentre estes vários sentidos que o olhar de compositor enxerga através da porta, certamente um dos mais comoventes é a espera pelo retorno da pessoa amada depois de um desentendimento amoroso. Seja para o momento de reconciliação sugerido em Perdoa (gravada em 1983) ou a ansiedade de ver o amor voltando para casa através da porta em Silêncio (música de Beto Surian lançada em 1994) e Pra ficar com você (canção de Mauro Motta e Carlos Colla para o disco de 1995).

A porta pode às vezes ser usada como a certeza de que o relacionamento chegou ao fim. E em uma briga é capaz dela surgir como argumento para uma pessoa se sobressair, mostrando que apesar da dissidência do momento, seu companheiro (ou sua companheira) ainda tem um sentimento muito grande.

Como mostra a terceira faixa do LP lançado por Roberto Carlos em 1988. Nos versos de Roberto e Erasmo, RC faz o desafio de que se ela disser que não o ama, vai ter de dizer isto mais de uma vez.


Segue a letra! Na foto, a parte interna da capa do LP de RC daquele ano. Um dado curioso: este registro foi usado como capa do disco Sonrie, que Roberto lançou para o mercado latino no início do ano seguinte.

Abraços a todos, Vinícius.

SE VOCÊ DISSER QUE NÃO ME AMA - Roberto e Erasmo

Se você disser que não me ama
Tem que me dizer mais de uma vez
Tem que me fazer acreditar
Em coisas que eu não quero ouvir

Tem que dizer tudo que eu detesto
Que não me suporta, que eu não presto
Tem que repetir por muitas vezes
Que não quer saber de mim

Tem que me dizer coisas horríveis
Inacreditáveis, impossíveis
Coisas que um homem não suporta
Ter que ouvir de uma mulher

Tem que me dizer que eu vá embora
Me botar daquela porta afora
E mesmo assim não sei se desse jeito
Em tudo isso vou acreditar

Tem que disfarçar o seu desejo
E não se excitar quando eu te beijo
Porque qualquer pequeno gesto seu
É um bom motivo pra eu ficar

Se você disser que não me ama
Tem que me dizer mais de uma vez...

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Post especial - FALSA LOURA



Olá, amigos.

Este blogue hoje abre espaço para um post especial que apresenta a vocês mais um encontro de Roberto Carlos com o cinema. Após estrelar três produções cinematográficas (Roberto Carlos em ritmo de aventura, Roberto Carlos e o diamante cor-de-rosa e Roberto Carlos a 300 km por hora) e de o cinema ter proporcionado encontros com Nelson Rodrigues (Roberto e Erasmo fizeram não só a música-tema gravada por Erasmo para Os 7 gatinhos, filme de Neville D'Almeida baseado na peça homônima do dramaturgo, como outras duas canções aparecem na trilha: Cavalgada e A primeira vez, ambas da dupla, nas gravações de RC), Dias Gomes e Lauro César Muniz (que escreveram o roteiro do filme O marginal, de Carlos Manga, com música-tema assinada por Roberto e Erasmo interpretada por Wilson Miranda) e até com o cinema americano (no filme Doze homens e outro segredo, a canção L'appuntamento, versão em italiano de Sentado à beira do caminho, apareceu na trilha, na voz de Ornella Vanoni) a discografia de RC agora se encontra com um dos grandes cineastas do Brasil.

Gaúcho radicado em São Paulo, CARLOS REICHENBACH tem 40 anos de carreira dedicada ao cinema nacional (como diretor e como fotógrafo), e mostra em sua filmografia a peculiaridade de mostrar o cotidiano em sua "verdade nua e crua" mas deixando sempre em evidência as questões psicológicas de seus personagens. Seus primeiros filmes aconteceram na época do surgimento da Boca do Lixo, quarteirão do bairro da Luz, em São Paulo, que reunia um grupo de pessoas interessadas em fazer cinema - e, anos depois desta reunião, as produções da região ficaram marcadas por trazerem forte apelo sexual. Nesta fase se destacam as suas pornochanchadas A ilha dos prazeres proibidos (de 1977), O império do desejo (de 1978)e Amor, palavra prostituta (de 1980), mas que se diferenciam das comédias eróticas da época por trazerem sempre reflexões em seus diálogos e por não apresentarem cenas de sexo gratuitas.

A densidade dos filmes que escreve e dirige continuou em destaque em algumas de produções seguintes, caso de Filme demência (de 1985), que, segundo o cineasta é "um Fausto paulistano", referência ao personagem escrito por Goëthe. Em 1986, com Anjos do arrabalde, ele voltaria sua câmera para questões sociais - no caso deste filme estrelado por Betty Faria, o cotidiano de professoras.

Com o "apagão cinematográfico" ocorrido no Brasil durante a gestão de Fernando Collor de Mello, Reichenbach só voltaria a estrear uma produção cinematográfica em 1993 - o poético Alma corsária. Seis anos depois, a nostalgia interiorana tomou as telas com o filme Dois córregos.

Aos 62 anos, Carlos Reichenbach é um dos poucos cineastas de muita estrada cinematográfica nacional que continua a lançar e a escrever seus filmes mesmo sem o apoio majoritário da Globo Filmes. E neste ano de 2008 novamente apresentou uma abordagem de seu olhar de "cinema feminino".

Falsa loura levou para as telas de cinema a história de Silmara (ótima atuação de Rosanne Mulholland), uma operária de uma grande indústria de São Paulo que mora com o pai Antero (vivido por João Bourbonnais), um ex-presidiário que sentiu na pele o crime que cometeu - o incendiário traz no rosto cicatrizes causadas pelo fogo. O filme mostra o cotidiano dela, as relações com o pai e o irmão (o homossexual Tê, interpretado por Léo Áquilla) e com suas colegas de trabalho, e seu envolvimento com dois cantores - o vocalista Bruno (papel de Cauã Reymond) do grupo Bruno e os seus Andrés e o cantor romântico Luiz Ronaldo (participação especial de Maurício Mattar).

O universo das mulheres operárias já havia rendido filmes como Lilian M., relatório confidencial (de 1974) e Garotas do ABC (de 2004) na filmografia de Carlos Reichenbach. Mas, com Falsa loura, a história da proletária que quer tornar seu cotidiano mais atraente e acaba adentrando pelo deslumbre do meio artístico é mais ácido ao revelar como algumas pessoas não têm o pudor de tratar as outras como coisas descartáveis. Um filme tão contundente quanto suas 17 produções anteriores - da qual se destaca também o recente Bens confiscados, de 2005.

A escalação do elenco tem algumas curiosidades: a personagem Briducha é vivida por Djin Sganzerla, filha do cineasta Rogério Sganzerla (diretor de destaque do Cinema Marginal, dentre eles O bandido da luz vermelha). Léo Áquilla, que faz o personagem Tê, foi durante anos repórter do Noite afora, programa erótico apresentado por Monique Evans na madrugada da Rede TV!. No papel de Milena, aparece Susana Alves, que ficou conhecida do grande público quando fazia a personagem Tiazinha no programa H, apresentado por Luciano Huck na TV Bandeirantes.

O lado intérprete de Roberto Carlos é evidenciado em Falsa loura. O cantor Luiz Ronaldo proporcionou que Maurício Mattar gravasse uma canção do repertório de RC para fazer parte da trilha da "falsa loura" Silmara. Lançada originalmente em seu LP de 1975, a música dos irmãos Isolda e Milton Carlos é revivida na voz de Maurício Mattar para mais uma ótima produção de Carlos Reichenbach.

Segue a letra! Na foto, o cartaz de Falsa loura, que este blogue recomenda - e diz que vale a pena esperar que seja lançado em DVD, caso já esteja fora do circuito de cinema.

Abraços a todos, Vinícius.

ELAS POR ELAS - Isolda e Milton Carlos

Hoje senti que é bem melhor
Não haver nada entre nós
Daqui pra frente

Pois você nunca percebeu
Tudo o que eu quis lhe dar de meu
Sinceramente

Você tentou dizer da paz
Com tantas frases tão banais
Que eu te faria feliz

Enquanto eu me enganei
Dizendo ao mundo que te amei
Você nem quis ouvir

Hoje senti que é bem melhor
Darmos as costas pro pior
Que está bem perto

Você vai ter que compreender
É assim mesmo que vai ser
Errado ou certo

Assim como você
Vai abrir mão do que passou
Tudo o que houve vai esquecer
Nem vai lembrar sequer quem sou

Elas por elas, decidi
Vai ser preciso te esquecer
Para viver em paz...

P.S.: no post de amanhã, este blogue retoma a série Casa, esquinas e quintais.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 4



Olá, amigos.

A série Casa, esquinas e quintais continua a enumerar as canções da discografia de Roberto Carlos que falam sobre lugares que fazem parte de uma casa. São recortes musicais que RC fez sobre o lar.

No post de hoje, este blogue apresenta um olhar diferenciado sobre um dito popular muito comum em nosso cotidiano. A frase "a grama do vizinho é mais verde do que a minha" costuma ser usada para mostrar que, muitas vezes, as pessoas preferem olhar as coisas que os vizinhos possuem a valorizar seus próprios pertences. Algum tempo depois, este ditado foi completado de maneira satírica com as palavras "até se descobrir que a grama dele é sintética".

Roberto e Erasmo também assinaram uma canção sobre uma parte da casa vizinha, mostrando que a observam não só com o olho de vizinhança mas também com o olhar de compositores. Dentre os vários cômodos da casa do vizinho, eles escolheram o QUINTAL - palavra usada para definir um terreno que fica nos fundos de uma casa, e geralmente tem uma horta ou um jardim.

E na segunda faixa do lado A do LP lançado por Roberto Carlos em 1975, ele relata uma "travessura" que uma pessoa fez no quintal do vizinho. No sonho de primavera cantado por RC, encerramos o quarto post da série Casa, esquinas e quintais.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos numa foto parecida com a capa de seu disco do ano de 1975.

Abraços a todos, Vinícius.

O QUINTAL DO VIZINHO - Roberto e Erasmo

Eu hoje acordei pensando
Num sonho que eu tive à noite
Sentei-me na cama para pensar
No sonho que eu tive

No sonho que eu tive...
No sonho que eu tive...

Fiquei tanto tempo pensando
Em tudo que estive sonhando
Que por um momento pensei ser verdade
O sonho que eu tive

O sonho que eu tive...

Sonhei que entrei no quintal do vizinho
E plantei uma flor
No dia seguinte ele estava sorrindo
Dizendo que a primavera chegou

E quando eu abri a janela
Estava um dia tão lindo
No outro quintal o vizinho sorrindo
Lembrei do meu sonho
O sonho que eu tive

O sonho que tive...

E quando eu abri a janela
O dia estava tão lindo
No outro quintal meu vizinho sorrindo
Lembrei do meu sonho, do sonho que eu tive

O sonho que eu tive...
O sonho que eu tive...
O sonho que eu tive...

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 3





Olá, amigos.

A série Casa, esquinas e quintais, que traz detalhes de uma vida de letra e música contadas em vários cômodos de uma habitação chega a uma nova parte que o cancioneiro de Roberto e Erasmo abrangeu. Primeiro, mostramos aquela casa simples, para, em seguida chegarmos em frente ao portão.

No texto de hoje ainda não adentramos na casa, pois a safra assinada por Roberto Carlos e Erasmo Carlos dedicou seus versos a um espaço peculiar que serve para tornar ainda mais exuberante a casa. Afinal, é no JARDIM que ficam as flores e as plantas, seja para enfeitar ou para utilizar em alguma eventualidade.

Mas este jardim apareceu na discografia de RC num contexto em que a música era um misto de homenagem e de resistência. No livreto As canções que mais gosto, publicado em 1972 encartado na revista Contigo, Roberto recordou o momento em que escreveu esta música:

"Esta eu fiz num hotel de Amsterdã, na Holanda. Segundinho estava no hospital submetendo-se a uma intervenção cirúrgica na vista. Eu, muito abatido e torcendo para que tudo desse certo com meu filho, comecei a escrever a letra. Segundinho é um menino saudável e a música ficou como uma das grandes recordações da minha vida".


No LP que apresentou suas primeiras gravações inspirado pelo estilo da soul music, em especial nas gravações de Não vou ficar, As curvas da Estrada de Santos e Sua estupidez, a faixa de abertura traz RC em um momento muito introspectivo do cantor. Apesar de ser creditada a co-autoria a Erasmo Carlos, o "Tremendão" declarou, em uma entrevista, que a canção foi praticamente escrita por Roberto. Não é o único exemplo desta parceria que está na Música Popular Brasileira - em alguns casos, inclusive, aconteceu de um deles escrever praticamente toda a música, mas o outro gravar (como Eu sou fã do monoquíni, gravada por Roberto, e É preciso dar um jeito, meu amigo, que Erasmo Carlos gravou).

Do inverno da Holanda veio a nostalgia das flores do jardim da casa - uma forma de amenizar o receio pelas conseqüências da primeira dentre as muitas intervenções cirúrgicas que Segundinho sofreria na vista. Na lembrança deste cômodo da casa vinha a busca pela certeza de que um novo jardim viria a reflorir em sua vida.

Segue a letra! Na foto, o registro presente no pôster que veio dentro do LP de RC em 1969.

Abraços a todos, Vinícius.

AS FLORES DO JARDIM DA NOSSA CASA - Roberto e Erasmo

As flores do jardim da nossa casa
Morreram todas de saudade de você
E as rosas que cobriam nossa estrada
Perderam a vontade de viver

Eu já não posso mais
Olhar nosso jardim
Lá não existem flores
Tudo morreu pra mim

Não, não, não, não posso mais
Olhar nosso jardim
Lá não existem flores
Tudo morreu pra mim

As coisas que eram nossas se acabaram
Tristeza e solidão é o que restou
As luzes das estrelas se apagaram
E o inverno da saudade começou

As nuvens brancas escureceram
E o nosso céu azul se transformou
O vento carregou todas as flores
E em nós a tempestade desabou

Eu já não posso mais
Olhar nosso jardim
Lá não existem flores
Tudo morreu pra mim

Não, não, não, não posso mais
Olhar nosso jardim
Lá não existem flores
Tudo morreu pra mim

Mas não faz mal
Depois que a chuva cair
Outro jardim um dia
Há de reflorir...

Eu já não posso mais
Olhar nosso jardim
Lá não existem flores
Tudo morreu pra mim

Não, não, não, não, não posso mais
Não posso mais
Olhar nosso jardim
Lá não existem flores
Tudo morreu pra mim...

sábado, 17 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 2



Olá, amigos.

Na seqüência da série Casa, esquinas e quintais, hoje batemos à porta para adentrar no lar das canções que Roberto Carlos compôs ou interpretou que trazem detalhes tão pequenos de um dia-a-dia de uma casa. Iniciamos com um panorama das recordações caseiras presente nos versos de Aquela casa simples, escrita por Roberto e Erasmo e lançada no LP de RC do ano de 1986.

Agora é a vez de passarmos para dentro da casa, e de um ponto de vista especialmente nostálgico, de quem retorna depois de muito tempo longe. Todos os sentimentos começam a passar pelo coração logo que se chega diante de um PORTÃO - aquela porta feita de ferro ou de madeira que serve para dar acesso ao quintal ou ao jardim de uma casa (palavras do Dicionário Aurélio).

No LP lançado por Roberto Carlos em 1974, uma das faixas foi destinada a mostrar em letra e música como é depois de tanto tempo estar em frente ao portão de casa. Algum tempo depois, Erasmo Carlos contaria em uma entrevista, como é o processo de composição dele com Roberto, e usaria como exemplo as idéias que geraram esta canção (recentemente, o Tremendão a incluiu em seu disco Erasmo Carlos convida - Volume II, dividindo os vocais com o grupo Kid Abelha):

"É como publicidade: vamos falando e tudo é válido. É o cineminha que a gente vai fazendo. Eu imagino uma coisa, por exemplo: o cara estava longe, viajando, e volta pra casa. Quando ele chega em casa, a gente começa com a câmera, né? Faz o cineminha. O cara se aproximando, parou em frente à casa dele, né? O que que ele vê? O cachorro... essa imagem é boa. O cachorro ficou feliz quando viu o dono, vem abanando o rabo. Aí a gente tem que botar essa imagem em forma poética. Então o cachorro abanando o rabo vira "meu cachorro me sorriu latindo". Aí o cara entra, o que ele vê dentro da casa? O retrato amarelado na parede. A gente faz uma espécie de laboratório, vai anotando as imagens, as rimas".

Neste segundo post da série Casa, esquinas e quintais, nosso panorama pelo cotidiano de um lar presente na discografia de Roberto Carlos agora chega em frente ao portão. E atravessa a porta, rumo a outras recordações que viriam nas canções que ele gravou.

Segue a letra! Na foto, uma imagem do clipe que ele fez para a música com a qual encerramos hoje - presente em seu Roberto Carlos Especial de 1976 e depois reapresentada no programa de 1979.

Abraços a todos, Vinícius.

O PORTÃO - Roberto e Erasmo

Eu cheguei em frente ao portão
Meu cachorro me sorriu latindo
Minhas malas coloquei no chão
Eu voltei

Tudo estava igual como era antes
Quase nada se modificou
Acho que só eu mesmo mudei
E voltei

Eu voltei agora pra ficar
Porque aqui, aqui é meu lugar
Eu voltei pras coisas que eu deixei
Eu voltei

Fui abrindo a porta devagar
Mas deixei a luz entrar primeiro
Todo o meu passado iluminei
E entrei

Meu retrato ainda na parede
Meio amarelado pelo tempo
Como a perguntar por onde andei
E eu falei:

Onde andei não deu para ficar
Porque aqui, aqui é meu lugar
Eu voltei pras coisas que eu deixei
Eu voltei

Sem saber depois de tanto tempo
Se havia alguém à minha espera
Passos indecisos caminhei
E parei

Quando vi que dois braços abertos
Me abraçaram como antigamente
Tanto quis dizer e não falei
E chorei

Eu voltei agora pra ficar
Porque aqui, aqui é meu lugar
Eu voltei pras coisas que eu deixei
Eu voltei

Eu parei em frente ao portão
Meu cachorro me sorriu latindo...

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Casa, esquinas e quintais - 1



Olá, amigos.

Com o post de hoje, este blogue inicia uma nova viagem pela discografia de Roberto Carlos. A série Casa, esquinas e quintais enumera canções gravadas por RC que citam a casa e os vários ambientes que cercam ou que fazem parte do imóvel. São momentos musicais que passam pelas habitações presentes em seu repertório.

De acordo com o dicionário, a palavra CASA define um "lar" ou "cada uma das divisões de uma habitação", "local destinado a reuniões ou até a moradias". E na vasta obra de Roberto Carlos também há espaço para contar todas as emoções vividas em ambientes mais particulares.

A primeira recordação da série traz a nostalgia em letra e música presente no LP de 1986. Ano em que RC passou para os que acompanham sua carreira um pouco do que sentiu naquela casa simples que desde 2000 faz parte do patrimônio da Prefeitura de Cachoeiro de Itapemirim e foi transformada na Casa de Cultura Roberto Carlos. A casa tem seis pequenos cômodos, uma varanda, um porão e, em seu jardim tem dois flamboyants. Aquela casa simples que saiu de suas recordações para fazer parte de sua obra como cantor e compositor.

Segue a letra! Na foto, uma vista externa da casa em que RC nasceu e viveu parte de sua infância. Atualmente, a fachada dela é pintada de azul.

Abraços a todos, Vinícius.

AQUELA CASA SIMPLES - Roberto e Erasmo

Naquela casa simples
Você falou pra mim
Que eu tivesse cuidado
E não sofresse com as coisas desse mundo

Que eu fosse um bom menino
Que eu trabalhasse muito
Que o nome do meu pai soubesse honrar
E nunca fosse um vagabundo

Ainda não era dia
E você me dizia
Deus te abençoe, te guarde
E se mantenha sempre em sua companhia

E eu te olhei nos olhos
E te beijei a mão
Te disse amém e o meu abraço
Fez você ouvir meu coração

Vida minha, vida minha...

E andando pela rua
Meu pai bem junto a mim
Olhava com ternura
A lágrima a molhar meu paletó de brim

Toda minha bagagem
Num banco da estação
Era de amor, coragem
As bênçãos do meu pai, a fé e um violão

E na cidade grande
Tristeza e alegria
Uma saudade imensa
E a solidão que eu ainda não conhecia

E o tempo foi passando
Então eu compreendi
Cada palavra sua
Naquela manhã do dia em que eu parti

Vida minha, vida minha...
Vida minha, vida minha...

E veio a primavera
E as flores do jardim
Enchiam de perfume
As cartas que chegavam de você pra mim

Mas hoje com sorrisos
Podemos recordar
Mas sempre que me lembro
A emoção me dá vontade de chorar

Vida minha, vida minha...
Vida minha, vida minha...

Recordações...

terça-feira, 13 de maio de 2008

120 anos da liberdade



Olá, amigos.

Há 120 anos, o Brasil conhecia um gesto de liberdade na nossa história. Após algumas leis que tentavam amenizar o regime escravocrata no país, a escravatura teve fim a 13 de maio de 1888.

Neste dia, a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea, que permitiu que acabasse de vez o sistema de escravidão no Brasil (último país da América a extinguir este mal). Embora seja uma vitória para o povo brasileiro e para os movimentos abolicionistas que aconteciam na época, historiadores afirmam que, na verdade, a escravatura acabou simplesmente porque já não era tão rentável para a economia brasileira. Como havia as constantes fugas deles para os quilombos e até mesmo ataques aos senhores de terra, achou-se um outro "meio" de exploração de mão-de-obra barata: os imigrantes.

De acordo com dados da época, a Lei Áurea abrangeu cerca de um milhão de escravos - um número considerado pequeno, mas que se justifica não só pela criação das leis anteriores (Lei do Ventre Livre, que concedia a liberdade para todo negro que nascesse a partir daquela data, Lei dos Sexagenários, permitindo a liberdade dos escravos que completassem 65 anos, e Lei Eusébio de Queirós, que determinou a extinção do tráfico negreiro) como por doenças e também pelo alistamento de alguns negros para servir à pátria durante a Guerra do Paraguai. Além da neta de Dom Pedro II, destacam-se como defensores da abolição da escravidão o Visconde de Rio Branco (responsável pela Lei do Ventre Livre) e os líderes José do Patrocínio e André Rebouças - que se miravam no exemplo de Zumbi, que no século XVII organizou o Quilombo dos Palmares, local de forte resistência negra.

Apesar desta vitória proporcionada pela Princesa Racial, o preconceito racial ainda se manifestou (e se manifesta) por muitos anos na sociedade brasileira. Isto se reflete até mesmo na televisão brasileira. Na novela A cabana do Pai Tomás, exibida pela TV Globo entre 1969 e 1970 ocorreu um dado curioso. A trama, assinada por Hedi Maia a partir do romance de mesmo nome de Harriet Beecher Stowe, contava a história de um escravo que participava de movimentos políticos no Sul dos Estados Unidos, durante a Guerra de Secessão. Em vez de um ator negro como protagonista, a empresa patrocinadora da novela (Colgate-Palmolive) impôs a escalação do ator Sérgio Cardoso - que, por ser branco, tinha que de pintar o corpo, colocar rolhas no nariz e usar peruca.

Parece incrível, mas cerca de 15 anos depois deste "incidente", a teledramaturgia da TV Globo se viu diante de um debate em horário nobre. Exibida no horário das 20h, a novela Corpo a corpo, escrita por Gilberto Braga, abordava o racismo através do personagem Alfredo Fraga Dantas (vivido por Hugo Carvana). Ele não aceitava o romance do filho Cláudio (papel de Marcos Paulo) com Sônia (interpretada por Zezé Motta). O público rejeitou o amor entre um "branco" e uma "negra", chegando a abordar o ator Marcos Paulo nas ruas para dizer coisas agressivas. Em um dos depoimentos de espectadores, foi dito que era uma vergonha expor este "amor" em horário nobre e Marcos Paulo foi "aconselhado" por um espectador a lavar sua boca com água sanitária após as cenas em que beijava sua colega de cena.

A teledramaturgia, que é vista por muitos como um "reflexo" do retrato que o povo quer ver de seu país, costuma centralizar as tramas em personagens ricos e/ou de classe média alta - poucos fogem deste panorama, como o autor Silvio de Abreu, que em 1995 colocou um núcleo de negros bem sucedidos financeiramente na sua novela A próxima vítima. Somente no ano de 2004 houve espaço para a primeira novela que teve como trama principal um romance inter-racial e uma protagonista negra - na novela das 19h, Da cor do pecado, que trazia Taís Araújo no papel de Preta, no texto escrito por João Emanuel Carneiro.

O Jornal Nacional também demorou a dar espaço em sua bancada para um apresentador negro - desde 2004 o jornalista Heraldo Pereira apresenta esporadicamente o noticiário, ou no sábado ou nas férias do casal de apresentadores William Bonner e Fátima Bernardes. Na música, a democracia, felizmente é maior e traz bons momentos para a Música Popular Brasileira - de Ataulfo Alves, Ismael Silva, Cartola e Agostinho dos Santos, passando por Tim Maia e Paulinho da Viola até chegar a nomes como Seu Jorge e Luiz Melodia.

Tim Maia, Erasmo Carlos e Roberto Carlos foram os responsáveis por trazer para o país o ritmo do soul - definido também como a música black americana - a partir do fim da década de 1960. Era aberta mais uma porta de um estilo de música fantástico para o cancioneiro mundial, e que deu margem a uma canção emblemática para tentar erradicar o preconceito racial - Black is beautiful, escrita por Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle e lançada por Elis Regina em seu LP Ela, de 1971.

Roberto Carlos também dedicou espaço a falar sobre diferença racial. Em seu LP de 1972, RC falou a partir dos versos de Maurício Duboc e Carlos Colla para a música Negra:


Ah! Quem dera eu esquecer
Da minha cor tão branca
E me perder nessa ilusão tão pura, nessa ilusão tão meiga
Nessa ilusão tão negra



Em seu LP de 1986, foi a vez de Roberto e Erasmo citarem uma negra, na primeira canção do lado B do disco. Com Nêga, a dupla mostrou a história de um "iniciante no samba" com uma neguinha irresistível:


Eu fui ver o samba lá no morro
Ela apareceu, enlouqueci
Quando ela sambou pedi socorro
Quando ela sorriu eu descobri: tô na dela, gosto dela

Nêga
A tristeza logo passa
Chega
Vem correndo, vem, me abraça...



No dia em que o Brasil recorda os 120 anos da Lei Áurea, que assinou a liberdade e o fim de um regime separatista de raças, este blogue encerra seu post com uma canção de Roberto e Erasmo que evidencia uma certeza sempre a ser lembrada: a de que, independente de raça, credo ou ideologia, todo mundo é alguém. Assim como diz a música presente no LP que Roberto Carlos lançou em 1988 (coincidentemente, ano em que se comemorou os 100 anos da Abolição da Escravatura).

Segue a letra! Na foto, a contracapa do disco de Roberto Carlos lançado no fim de 1988.

Abraços a todos, Vinícius.

TODO MUNDO É ALGUÉM - Roberto e Erasmo

Somos uma multidão de iguais
Semelhantes sonhos, ilusões
Direções diversas na conquista
Dos ideais, universais

Não se escreve o nome de um homem
Em tudo o que ele faz
Mas onde ele põe suas mãos
Estão as digitais

Não importa qual a cor do homem
Como ele se veste, de onde vem
Dentro de um castelo ou de um barraco
Ele é alguém com o que tem

É guerreiro nessa disputa
E onde ele estiver
O respeito por sua luta
É tudo o que ele quer

Debaixo desse céu
Sob a luz do mesmo sol
Todo mundo é alguém

Quem é quem?
Quem é quem?
Nesse mundo
Todo mundo é alguém

Quem é quem?
Quem é quem?
Nesse mundo
Todo mundo é alguém

Da semente ao trigo quantos são
Pra fazer chegar à mesa o pão
Do barro até o topo de um arranha-céu
Quantos estão nessa missão

Todo ser humano é importante
Naquilo que ele faz
Às vezes por caminhos distantes
Mas todos são iguais

Por isso
Quem é quem
Se aos olhos de Deus
Todo mundo é alguém

Quem é quem?
Quem é quem
Nesse mundo
Todo mundo é alguém

Quem é quem?
Quem é quem?
Nesse mundo
Todo mundo é alguém...

domingo, 11 de maio de 2008

Feliz Dia das Mães



Olá, amigos.

Chegamos a um dia especialíssimo para deixar ainda mais forte os laços familiares, e no qual agradecemos por termos nascido. Afinal, se não fosse por nossas mães, não estaríamos aqui neste momento.

O Dia das Mães passou a ser comemorado no início do século passado, quando a americana Annie Jarvis quase entrou em depressão após o falecimento de sua mãe. Suas amigas decidiram que a partir daquele momento haveria uma festa todos os anos em memória ao dia em que a mãe dela se foi - mais tarde, a própria Annie pediria que este dia fosse destinado a homenagear todas as mães (mortas ou vivas).

A comemoração do Dia das Mães passou a fazer parte oficialmente dos calendários americanos a partir do ano de 1914 - o presidente Woodrow Wilson marcou-a para o dia 9 de maio. A idéia de dedicar um dia às mães prosseguiu em outros países, alguns que dedicaram um dia específico para ela (casos da Rússia, que comemora em 8 de março, a Polônia, em 26 de maio, e a Costa Rica, em 15 de agosto) e outros que estipularam um dia móvel (Portugal, Hungria, Espanha e Suécia comemoram no primeiro domingo de maio e a Argentina comemora no terceiro domingo de outubro).

No Brasil, o então presidente Getúlio Vargas instituiu, a partir de decreto de 1932, que o Dia das Mães faria parte do calendário brasileiro em todos os segundos domingos de maio. E para um artista tão ligado a sua família, Roberto homenagearia todos os tipos de mães.

A mãe ainda em gestação, a mãe que ele espiava ainda tendo contato com o filho que ela se habituava a ter em sua vida aparece em Você é linda, sua e de Erasmo Carlos presente em seu LP de 1972. No mesmo disco, ainda havia espaço para outros dois momentos que remetem à mãe: o cântico criado em Acalanto, de Dorival Caymmi, tinha uma versão sua, e o dia-a-dia de um pai que convive com a esposa que agora tem a função de mãe surge em Quando as crianças saírem de férias.

Mas além das mães que ele "espiava" em sua sensibilidade musical, RC ainda trazia espaço para recordações que a envolviam em sua infância. Em todas estas imagens, sua mãe aparecia num misto de sorriso por ver o filho seguir seus próprios rumos com a tristeza de incerteza do que o mundo poderia apresentar para ele. Em O divã (de 1972), A estação (do LP de 1974) e Aquela casa simples (de 1986), da janela de um trem que ia além do horizonte ele via sua infância e a segurança do colo da mãe ficarem para trás, em meras e doces lembranças.

Mas outra mãe o acompanhava... A mãe de Jesus, a quem ele recorria seguidamente tanto em O terço (do disco de 1996) quanto na grandiosa Nossa Senhora (de 1993) e em todas as facetas que ela possui, reunidas na música Todas as Nossas Senhoras (presente na compilação de 1999).

Mas, por mais que Roberto, e por mais que todos nós já tenhamos nossas vidas, nossas famílias, em todos os segundos domingos de maio do calendário nós voltamos nosso coração para homenagear nossas mães. Aquelas que nos carregam no calor de sua barriga, no colo para nos ninar e para quem jamais deixamos de ser meninos.

A canção com a qual encerramos o post de hoje traz um título muito pessoal para Roberto Carlos - embora traga a co-autoria de Erasmo Carlos. Mas, certamente, embora cite o nome da mãe de RC, estas palavras apresentadas por ele em seu LP de 1978 servem perfeitamente para nós, filhos, agradecemos a nossas mães neste dia de hoje.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos ao lado de sua mãe, Laura Moreira Braga, ou, simplesmente, Lady Laura.

LADY LAURA - Roberto e Erasmo

Tenho às vezes vontade de ser
Novamente um menino
E na hora do meu desespero
Gritar por você

Te pedir que me abrace
E me leve de volta pra casa
Que me conte uma história bonita
E me faça dormir

Só queria ouvir sua voz
Me dizendo, sorrindo:
"Aproveite o seu tempo
Você ainda é um menino"

Apesar da distância e do tempo
Eu não posso esconder
Tudo isso eu às vezes preciso
Escutar de você

Lady Laura, me leve pra casa
Lady Laura, me conte uma história
Lady Laura, me faça dormir
Lady Laura...

Quantas vezes me sinto perdido
No meio da noite
Com problemas e angústias
Que só gente grande é que tem

Me afagando os cabelos
Você certamente diria:
"Amanhã de manhã
Você vai se sair muito bem"

Quando eu era criança
Podia chorar nos seus braços
E ouvir tanta coisa bonita
Na minha aflição

Nos momentos alegres
Sentado ao seu lado sorria
E nas horas difíceis podia
Apertar sua mão

Lady Laura, me leve pra casa
Lady Laura, me abrace forte
Lady Laura, me faça dormir
Lady Laura...

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Post especial - ARTUR DA TÁVOLA, 72 anos




Olá, amigos.

Este blogue excepcionalmente traz um novo post no dia de hoje. Esperamos a compreensão de todos os que acessam este espaço, mas, certamente, é por um motivo especialíssimo que abrange a carreira de Roberto Carlos.

Na tarde de hoje, o Brasil se despediu de um ícone da política, do jornalismo e de sua poesia. Aos 72 anos, faleceu Paulo Alberto Moretzsohn Monteiro de Barros, ou apenas ARTUR DA TÁVOLA.

Natural do Rio de Janeiro, Artur era o radialista Paulo Alberto em seu início de carreira. Entretanto, o golpe militar de 1964 fez com que ele saísse do país. Quatro anos depois, retornou ao Brasil, mas, por conta da perseguição que sofria pelos militares, passou a assinar com o nome pelo qual foi conhecido durante boa parte de sua vida - o nome do rei dos Cavaleiros da Távola Redonda.

Como político, iniciou sua trajetória em 1960, ainda pelo Partido Trabalhista Nacional (PTN), no antigo estado da Guanabara. Dois anos depois, ele migraria para o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), se destacando por ser um político discreto.

Anos mais tarde, se tornaria um dos fundadores do Partido Social da Democracia Brasileira (PSDB), chegando a ser presidente dele entre os anos de 1995 e 1997. Távola por muitas vezes tentou ser candidato a cargos mais importantes no Rio de Janeiro - a prefeito da cidade do Rio de Janeiro em 1996 (mas o partido decidiu que Sérgio Cabral Filho seria o candidato) e a governador do estado do Rio de Janeiro em 1998 (sendo preterido para entrar em seu lugar Luiz Paulo Corrêa da Rocha). No ano de 1999, ele optou pelo desligamento do partido, que, segundo ele, estava "se distanciando dos ideais de sua fundação".

Ao lado de sua trajetória política, que incluiu dois mandatos como deputado federal e dois mandatos como senador (ambos os cargos pelo estado do Rio de Janeiro), Artur da Távola manteve seu trabalho como jornalista. Além de ter sido diretor por muitos anos da Rádio Roquette Pinto, foi colunista dos jornais O Dia e O Globo. Na TV Senado, apresentou o programa Quem tem medo de música clássica?, falando sobre música erudita.

Sua ligação com a Música Popular Brasileira viria no ano de 1986. No Roberto Carlos Especial daquele ano, além de convidados como Tom Jobim, Erasmo Carlos, Ranchinho, Gal Costa e as duplas Chitãozinho & Xororó e Christian & Ralph, Roberto abriu espaço para ter em seu programa as participações luxuosas de mestres da literatura brasileira na redação de seu especial. As palavras deles apresentavam números interpretados por RC: o poeta cachoeirense Rubem Braga fez o texto de apresentação para Aquela casa simples (o texto foi narrado pela atriz Patrícia Pillar), e coube a Ferreira Gullar falar sobre o Brasil no texto (dito pelo próprio Roberto) que antecedia um número de A guerra dos meninos feito no Palácio do Planalto, em Brasília.

E Artur da Távola presenteou a todos que acompanharam o programa com palavras belíssimas sobre um tema presente no LP que Roberto Carlos lançou em 1986. Na voz da atriz Glória Pires, vieram as belas palavras de Artur da Távola:

"Só quando o homem vivencia a morte descobre o verdadeiro valor da vida. A humanidade precisou construir artefatos de morte em massa pra perceber que a vida é o bem supremo. Precisou poluir matas e rios para melhor entender a natureza.

Precisou armar o apocalipse, para compreender o significado de uma flor. Precisou matar os rios, para vivenciar a destruição como um mal. Precisou afundar-se na violência, para reinventar o gesto de amizade e paz.

Talvez o homem só aprenda pelo contraste. Sem conflito entre decisões, idéias e conceitos, não aparece a maravilha da liberdade. O apocalipse é o oposto sombrio da proclamação da vida. A vida é mais forte que a morte, o amor que o ódio, a liberdade que a prisão, a esperança que a depressão. O homem matará o apocalipse de amor".

Assim como o texto de Távola, os versos da música de Roberto e Erasmo (que abre o LP lançado em 1986 por Roberto Carlos) permanecem atuais. O apocalipse permanece sendo escrito, em tempos de dor e de falta de amor que culminam em casos alarmantes de violências, crimes e até mesmo de atos impensáveis como a morte de uma criança pelo próprio pai.

Segue a letra! Na foto, Artur da Távola, 72 anos.

Abraços a todos, Vinícius.

APOCALIPSE - Roberto e Erasmo

Perto do fim do mundo
Como negar o fato?
Como pedir socorro?
Como saber exato?

O pouco tempo
Que resta
Só vai sobrar
O que presta

Perto do fim do mundo
Quem quer correr não pode
Onde há fumaça, há fogo
Quando a verdade explode

Muitos não querem ver
Mentes em eclipse
Mas tudo está escrito
No apocalipse

Olho os jornais e estremeço
Todo final tem seu começo
Taças amargas derramadas
Profecias confirmadas

Alertam
Que é o fim da estrada
Tempo de dor
Falta de amor

Perto do fim do mundo
Drogas num mar sem porto
A violência, o crime
Na aprovação do aborto

Por tudo isso
Se a Terra treme
Só quem não deve
Não teme

Olhos os jornais e estremeço
Todo final tem seu começo
Taças amargas derramadas
Profecias confirmadas

Alertam
Que é o fim da estrada
Tempo de dor
Falta de amor

Pra quem seguir seus passos
E o seu amor profundo
Ele virá trazendo
A luz de um novo mundo

Perto do fim do mundo
Como negar o fato...

Todos os novos rumos de Roberto Carlos



Olá, amigos.

Depois de ter lançado o perfume Emoções (desde o início deste mês, a Racco vem divulgando a propaganda do novo cheiro de amor espalhado no ar por Roberto Carlos), RC agora promete usar seu nome para comercializar outro produto. De acordo com a colunista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, ele está em negociações com uma montadora de carros japonesa para lançar uma linha de veículos, provisoriamente batizada de RC.

A velocidade é um tema recorrente nas canções escritas por Roberto Carlos (sozinho ou com Erasmo)ou interpretadas por ele. Foi através dela que Parei na contramão o colocou rumo às paradas no ano de 1963. No ano seguinte, O calhambeque ganharia as ruas e as rádios de todo o país, nesta versão de Road Hog assinada por Erasmo.

E Roberto ficaria mais veloz em 1967, ano de lançamento do LP de seu filme Roberto Carlos em ritmo de aventura, que além de Eu sou terrível (canção que selou o retorno do cruzamento das estradas de Roberto Carlos e Erasmo Carlos após cerca de um ano em que mal entendidos fizeram com que tomassem rumos diferentes) trouxe a romântica Por isso corro demais (assinada apenas por Roberto Carlos).

Mas vinham novos tempos, acabava-se a inocência da Jovem Guarda, e a associação de carros a brotos e a situações típicas da jovialidade de sua obra ia ficando para trás, era apenas uma lembrança vista pelo retrovisor. Chegou a vez das letras se debruçarem sobre os momentos que a velocidade era uma válvula de escape para esquecer amores perdidos e momentos de solidão - As curvas da Estrada de Santos e A 200 km por hora, respectivamente de 1969 e 1970, dois anos de um Roberto Carlos mais veloz e mais furioso. Décadas depois destes desabafos nos moldes do soul, a dor-de-cotovelo e sua tentativa de amenizá-la a quatro rodas voltaria em ritmo neo-sertanejo, através de Todas as manhãs, de 1991.

Em sua estrada musical, Roberto teve a convivência com pessoas que têm o carro como seu instrumento de trabalho, e a estrada como escritório de cada dia. Duas classes trabalhadoras passaram por seu cancioneiro: os caminhoneiros, nas canções Caminhoneiro, de 1984, e O velho caminhoneiro, de 1993, e os motoristas de táxi, na música O taxista, de 1994.

E revendo a Jovem Guarda pelo espelho na distância se perder, no ano de 2003 Roberto decidiu novamente encontrar os velhos tempos e belos dias vividos no período "jovem-guardista" através de letra e música. Se no LP É proibido fumar, de 1964, O calhambeque era priorizado em detrimento de um Cadillac, no disco Pra sempre, de 2003, a música O Cadillac homenageava o carro de 1960, deixando o Calhambeque apenas como citação. Atualmente, em seus shows Roberto canta um pout-pourri dedicado às canções de velocidade, apresentando todos os rumos de sua carreira.

Em uma vida musical com tantas citações à velocidade, por estradas com carros, carrões, Cadillacs, calhambeques (desde a lambreta de Susie), RC promete recordar o tempo que vivia a 200 km por hora lançando, até o fim do ano, a linha de carros RC. Uma linha condizente com o artista que é terrível e anda sempre numa caranga que é máquina quente, como já disse no início de seu filme Roberto Carlos em ritmo de aventura.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos no show que fez em 12 de junho do ano passado na casa de espetáculos Canecão, no Rio de Janeiro. A foto (feita por este que vos escreve) é do momento em que cantou a música O calhambeque.

Abraços a todos, Vinícius.

EU SOU TERRÍVEL - Roberto e Erasmo

Eu sou terrível
E é bom parar
De desse jeito
Me provocar

Você não sabe
De onde eu venho
O que eu sou
E o que tenho

Eu sou terrível
Vou lhe dizer
Que ponho mesmo
Pra derreter

Estou com a razão no que digo
Não tenho medo nem do perigo
Minha caranga é máquina quente

Eu sou terrível
Vou lhe contar
Não vai ser mole
Me acompanhar

Garota que andar do meu lado
Vai ver que ando mesmo apressado
Minha caranga é máquina quente
Eu sou terrível, eu sou terrível

Eu sou terrível...

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Metalinguagem de Roberto Carlos



Olá, amigos.

Como o dicionário indica, metalinguagem serve para um autor brincar com o próprio sistema de escrita. Este recurso muitas vezes é utilizado na literatura e traz alguns exemplos também nas letras assinadas no cancioneiro da Música Popular Brasileira - seja para mostrar a maneira como o artista faz suas músicas ou para mostrar suas relações com o palco, com o público, e até mesmo com as gravadoras.

Chico Buarque, autor de tantas palavras que enobrecem nosso repertório, já falou sobre a poesia em Uma palavra, contou do artista no palco nos versos de Tempo e artista e criou uma alegoria para mostrar o "confronto" entre artista e gravadora na música A voz do dono e o dono da voz - e até em músicas feitas para a voz de outros cantores consegue fazer uma metalinguagem com o meio artístico, casos de Beatriz (feita em parceria com Edu Lobo), gravada originalmente por Milton Nascimento, e Bastidores, feita sob medida para Cauby Peixoto. Caetano Veloso foi mais literato em Língua, indo de Camões à Estação Primeira de Mangueira. E Gilberto Gil arriscou seguir o molde que achava ideal para ter um sucesso radiofônico, ao ponto de colocar em sua canção o título de Essa é pra tocar no rádio (que, curiosamente, não foi muito tocada nas rádios na época).

Roberto Carlos também traz em seu repertório momentos em que apresenta ao público sua verdade como artista. Para um compositor que em letra e música homenageou pais (Meu querido, meu velho, meu amigo e Lady Laura), filhos (Ana, As flores do jardim da nossa casa e Fim de semana), tia (Minha tia), dedicou músicas às mulheres que amou e a seus amigos (destaque para o amigo de fé e irmão camarada), também houve espaço para fazer alusões à sua estrada na Música Popular Brasileira.

A mais explícita, certamente, é Emoções, gravada em 1981, até hoje sinônimo de relatos de momentos lindos vividos e revividos a cada show. Na mesma linha, Eduardo Lages e Paulo Sérgio Valle o presentearam em 1990 com Cenário, que em letra e música fala sobre os artistas que em momentos muito alegres cantam canções muito tristes e que em momentos tristes cantam canções alegres.

Mas a obra de RC também tem espaço para citações a suas próprias canções. A própria Cenário traz um achado: a certa altura da gravação, o piano dedilha frases musicais de Emoções. Já nos versos de seu repertório, há algumas canções que chamam atenção por dialogarem com músicas anteriores.

Lançada em 1996, Comandante do seu coração relembra um tempo em que RC dizia (em seus versos assinados com Erasmo Carlos) ser do tipo que manda flores. Na segunda metade da década passada, ele dizia:

Posso ser meio antiquado
Quem sabe, não sei
Um amante à antiga
Como já falei


A referência era à música Amante à moda antiga, presente no LP de 1980. O amante à antiga retornava 16 anos depois, com a ambição de ser o comandante dos mares da emoção de seu grande amor - e recorrendo a bons momentos anteriores para sensibilizar a mulher.

Retornando ainda mais na discografia de Roberto Carlos, nota-se que um dos maiores sucessos de sua carreira também traz espaço à metalinguagem. Antes de cantar a história de O calhambeque, RC cita, por ordem de entrada em cena, as canções Susie, Parei na contramão e Splish splash:

Essa é uma das muitas histórias que acontecem comigo
Primeiro foi Susie, quando tinha lambreta
Depois, comprei um carro e parei na contramão
Tudo isso sem contar o tremendo tapa que levei com a história do Splish splash
Mas essa história também é muito interessante...


Mas seria no mesmo LP de O calhambeque - É proibido fumar, de 1964 - que RC faria sua canção mais explícita nesta alusão a obras gravadas anteriormente. Poucas pessoas conseguem perceber esta brincadeira pois a maioria das músicas citadas não foi relançada até o momento - são músicas presentes em seus primeiros compactos e também em Louco por você, seu primeiro LP lançado em 1961 e até hoje jamais apresentado em CD.

Na penúltima faixa do lado B de É proibido fumar, aparecem referências às seguintes canções:

- Malena (assinada por Rossini Pinto e Fernando Costa, lançada em compacto em 1962 e que, em 1963, rendeu a "continuação" Relembrando Malena)

- Susie (de Roberto Carlos, gravada em 1962),

- Chore por mim (presente no disco Louco por você, versão de Julio Nagib para a marcante Cry me a river, de Arthur Hamilton),

- Splish splash (versão de Erasmo Carlos para sucesso de Bobby Darin, e, ao lado de Parei na contramão, um dos grandes sucessos do LP de 1963)

- Baby, meu bem (também do LP de 1963, assinada por Hélio Justo e Tito Santos)

- Mr. Sandman (presente no disco Louco por você, de 1961, versão de Carlos Alberto para música de Pat Ballard)

- Brotinho sem juízo (música de Carlos Imperial, lançada em compacto no ano de 1960)

- Linda (original de Bill Caesar, vertida para o português por Carlos Imperial)

- Triste e abandonado (gravada em compacto lançado em 1962, assinada por Hélio Justo e Erly Muniz)

E, naturalmente, a canção que tem o título "parodiado" na música escrita por Roberto e Erasmo, que é também citada nos primeiros acordes da canção de 1964: Louco por você, versão que Carlos Imperial fez para Careful, careful, de Lee Pockriss e Paul Vance. Uma forma de mostrar que, além de revisitar tudo o que havia escrito anteriormente, Roberto contava em seu LP É proibido fumar que, àquela altura de sua carreira, louco ele não estava mais.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos em foto que foi posada para a contracapa do disco que lançou em 1964.

Abraços a todos, Vinícius.

LOUCO NÃO ESTOU MAIS - Roberto e Erasmo

Louco não estou mais, Malena eu esqueci
Susie, aquela ingrata, nunca mais eu vi
Vivo chorando
E ninguém chora por mim

Meu beijo já não faz, não faz "splish splash"
Nunca mais chamei ninguém de "baby, meu bem"
Vivo chorando
E ninguém chora por mim

Até Mister Sandman me aconselhou
Roberto, tome jeito, arranje um amor
Brotinho sem juízo deixe de ser
Senão em sua vida você vai sofrer

Linda foi namoro que pouco durou
Triste e abandonado atualmente eu estou
Vivo chorando
E ninguém chora por mim

Pertinho de onde eu moro tem um broto encantador...
Linda, oh, Linda...
Mister Sandman...
Baby, meu bem...
Oh, oh, oh, Malena...
Splish, splash...

Até Mister Sandmam me aconselhou
Roberto, tome jeito, procure um amor
Brotinho sem juízo deixe de ser
Senão em sua vida você vai sofrer

Linda foi namoro que pouco durou
Triste e abandonado atualmente eu estou
Vivo chorando
E ninguém chora por mim

E ninguém chora por mim...

segunda-feira, 5 de maio de 2008

Crônicas da vida - COMEÇO, MEIO E...



Olá, amigos.

Em mais um momento que faz parte de Crônicas da vida, este que vos escreve hoje apresenta um texto mais "ambicioso" a partir da discografia de Roberto Carlos. Em vez de fazer uma crônica que faz alusão a uma das canções que RC gravou, o texto de hoje arrisca contar uma história em começo, meio e fim - tendo como trilha musical a voz de Roberto Carlos.

Segue o texto! Na foto, Roberto Carlos durante a década de 1990. Ratifico aqui a certeza de que quero MUITO saber da opinião de vocês, foi um dos textos que me dediquei com mais afinco para que agradasse a todos.

Abraços a todos, Vinícius.

***

COMEÇO, MEIO E...

Achava que aquela festa ia ser mais um momento de ir a um lugar pra chegar lá e jogar conversa fora com meus amigos até altas horas, mas, mesmo a contragosto (e excluído, tanto por meu coração estar sozinho em meio a casais apaixonados quanto por me sentir ridículo naquele terno de pingüim), acabei indo lá. Primeiros instantes do baile, e o panorama parecia ser o que eu previa (e temia), eu na companhia da minha solidão. Até que meus olhos foram tomados por um brilho que jamais adentraram antes na minha vida.

Parou... olhou
Depois sorrindo se afastou
O meu coração se enamorou
E acho que eu me apaixonei


O baile podia prosseguir, as músicas podiam mudar, mas daquele momento em diante todos os meus sentidos seriam em direção a ela. Por mais que seu olhar jamais tivesse dialogado com o meu, o simples fato de seus olhos terem repousado por um instante nos meus seria uma lembrança para carregar por toda vida.

Eu me encaminhava para pegar mais uma bebida, quando ela tomou a minha frente. Sorria. Ao fundo começava uma música lenta. Não dissemos uma palavra. A abracei pela cintura, tomei sua mão e passeamos pelo salão. Parecia que meu mundo passeava apenas por um caminho - que era ela que trilhava. A música vinha apenas do lirismo que ela apresentava em cada um de seus gestos. E eu a sentia, junto de mim pela primeira vez, mas querendo guardar cada momento como se fossem os últimos segundos de alegria da minha vida.

Me abrace mais forte
Não se importe com os outros casais
Que bom se essa música
Não terminasse jamais


Mas a música acabou. Olhei-a mais uma vez, querendo guardar cada detalhe de seu semblante. Meus olhos, marejados, já notavam que havia outras pessoas no salão. Esboçava uma despedida cordial, quando ela me puxou pelo braço, até uma varanda. A Lua, minguante, assistiria ao acontecimento que meus olhos não deixaram ver, mas meus outros sentidos mostraram para mim cada detalhe de todo sentimento que se iniciava naquele instante.

Aquele beijo que te dei
Nunca, nunca mais esquecerei
A noite linda de luar
Lua, testemunha tão vulgar


O dia amanheceu sem nós dois nos darmos conta. Naquela hora já achávamos que a noite era linda demais para ter fim. E então decidimos que teríamos mais noites, e mais dias, lado a lado.

A namorada à minha espera
Meu refúgio, meu regresso
Minha vida, meu amor...


Desde então, vivemos declarações de amor ditas apenas através de uma troca de olhares. Que cada vez ficavam mais sérios, fazendo com que eu buscasse palavras cuidadosamente escolhidas para conhecer um pouco mais:

Eu te proponho
Nós nos amarmos
Nos entregarmos...


E eu ouvia a resposta, em tom de suplício, já que as convenções aparentemente não permitiam:

Falando sério
É bem melhor você parar com essas coisas
De olhar pra mim com olhos de promessas
Depois sorrir, como quem nada quer


Aos poucos, enxergando ainda mais a alma um do outro, e sabendo que cada passo que déssemos de comum acordo seria um momento a mais para anotar em nossas lembranças. Enfim, nos casamos e sentimos os sabores da nossa lua-de-mel.

Numa noite inesquecível
Controlar foi impossível
Tudo aquilo a sós
A primeira vez
O amor se fez...


Seria a primeira das muitas noites que passamos bem acompanhados. Fazendo de nós apenas um só, entre suspiros, delírios, sussurros de mais outras noites que demorariam a acabar...

Vou cavalgar por toda noite
Por uma estrada colorida
Usar meus beijos como açoite
E minha mão mais atrevida




No seu corpo é que eu encontro
Depois do amor, o descanso
E essa paz infinita




Chovia lá fora
E a capa pendurada
Assistia a tudo
E não dizia nada




E na grandeza desse instante
O amor cavalga sem saber
Que na beleza dessa hora
O sol espera pra nascer


Tendo sempre esse cheiro do amor meu e dela e que virou nosso. Na certeza de que éramos almas que se encontraram por acaso, e que apresentamos um ao outro a beleza de amar e de ser amado.

Cada parte de nós tem a forma ideal
Quando juntas estão, coincidência total
Do côncavo e o convexo
Assim é nosso amor...


Algum tempo depois de nos mudarmos para nossa casa, descobrimos que íamos ter o nosso primeiro filho. E ela parecia ainda mais bonita nesta nova maneira de ser mulher.

Você é linda
Esperando neném...


Mas na nova vida familiar, conheceríamos nossas primeiras brigas. E começaríamos a aprender que as dissidências ficam maiores quando há uma vida em comum. Ainda mais quando tivemos mais filhos, e eu tive de passar a disputar a atenção com eles.

Quando as crianças saírem de férias
Talvez a gente possa então se amar
Um pouco mais...


Procuramos amenizar com viagens, com tentativas de deixar de lado as questões. Só que os problemas continuam, e às vezes ficam mais fortes. E do meu lado da cama, eu refletia:

Por que me arrasto a seus pés?
Por que me dou tanto assim?
E por que não peço em troca?
Nada de volta pra mim!


Ela me dizia, todos os dias:

Você não me fala
Mas bem que eu pressinto
Existe algo errado
Entre nós dois


Aos poucos, vivíamos o lado modorrento de uma solidão a dois. O amor que tinha nos unido agora era o culpado para esta obrigação que se tornara nossa vida.

Sem motivos, vou vivendo por aí
Por viver
Meus valores tão confusos
Reprimidos por você


E naquele maldito dia, enfim decidi tomar a iniciativa. Com os olhos fechados para o passado que tínhamos sido, talvez para que a dor da separação latejasse menos, eu anunciei:

Não se culpe, eu aprendi
O sentimento ninguém domina
Te agradeço, eu fui feliz
Mas o meu sonho de amor termina


Tentei reaprender a andar sozinho. Mas toda vez que eu achava ter me recuperado da ausência, eis que vinha sua voz, ao telefone:

Como vai você?
Eu preciso saber da sua vida
Peça a alguém pra me contar sobre o seu dia
Anoiteceu e eu preciso só saber...


Dessa vez, era para dizer uma coisa rápida:

As flores do jardim da nossa casa
Morreram todas
De saudade de você


O que parecia ser nostalgia, eu traduzia em péssimas lembranças. Se para ela eu era uma boa saudade, para mim, ela continuava a acenar com uma esperança que jamais iria se concretizar. Decidido a deixar de lado este sentimento, falei:

Acabe com essa droga de uma vez
Não, não volte nunca mais pra mim


E ouvi como resposta, com certo alívio:

Tente esquecer de você
Que um dia me amou


E eu esqueci. Depois de anos de casado, sem intenção de construir uma vida, por mais bonita que fosse uma vida a dois, também decidi viver sozinho. Claro que, sempre tendo companhia também dos meus filhos que costumam me visitar. De repente, ser livre não me assustava mais.

Eu pensava isso. Exatamente até as cinco e meia da tarde de hoje, quando esse turbilhão de sensações, de lembranças, de alegrias e dissabores vieram à minha cabeça.

Você passou pela rua
E o passado voltou a lembrar seus abraços
E mais uma vez eu te amei
E lembrei de você linda e nua em meus braços

Quase que chamei você
Mas olhei pra mim mesmo e parei nos meus passos
De tanta saudade percebi que um homem
Também sabe chorar


E me fizeram agora te ligar a essa hora da noite pra que eu depois de te dizer todas essas coisas, terminasse a ligação com essa pergunta. Será que ainda posso pensar em conquistar você pela segunda vez?

Eu sei que eu tenho um jeito
Meio estúpido de ser
Mas é assim que eu sei te amar


***
Músicas citadas (por ordem):

PAREI...OLHEI - Rossini Pinto
MÚSICA SUAVE - Roberto e Erasmo
AQUELE BEIJO QUE TE DEI - Édson Ribeiro
A NAMORADA - Maurício Duboc e Carlos Colla
PROPOSTA - Roberto e Erasmo
FALANDO SÉRIO - Maurício Duboc e Carlos Colla
A PRIMEIRA VEZ - Roberto e Erasmo
CAVALGADA - Roberto e Erasmo
SEU CORPO - Roberto e Erasmo
OS SEUS BOTÕES - Roberto e Erasmo
O CÔNCAVO E O CONVEXO - Roberto e Erasmo
VOCÊ É LINDA - Roberto e Erasmo
QUANDO AS CRIANÇAS SAÍREM DE FÉRIAS - Roberto e Erasmo
DESABAFO - Roberto e Erasmo
EXISTE ALGO ERRADO - Maurício Duboc e Carlos Colla
VIVENDO POR VIVER - Márcio Greyck e Cobel
SUPER-HERÓI - Roberto e Erasmo
COMO VAI VOCÊ? - Antônio Marcos e Mário Marcos
AS FLORES DO JARDIM DA NOSSA CASA - Roberto e Erasmo
DO FUNDO DO MEU CORAÇÃO - Roberto e Erasmo
TENTE ESQUECER - Isolda
MAIS UMA VEZ - Maurício Duboc e Carlos Colla
UM JEITO ESTÚPIDO DE TE AMAR - Isolda e Milton Carlos

sábado, 3 de maio de 2008

1968, o ano que não terminou



Olá, amigos.

Em um capítulo à parte após a série que enumerou em décadas a carreira de Roberto Carlos, este que vos escreve aproveita hoje para fazer um paralelo entre RC e a obra de um grande escritor e jornalista do nosso país. Trata-se de ZUENIR VENTURA.

Recentemente, Zuenir concluiu a obra 1968 - O que foi feito de nós, um novo olhar sobre o ano já abordado no livro que lançou duas décadas antes - 1968 - O ano que não terminou. Após, no primeiro livro, contar com detalhes alguns momentos do fatídico 1968, o autor aproveitou a nova edição de seu livro para fazer um panorama sobre o que teria sido feito de todos nós.

O calendário de fatos que marcaram a história universal traz muitas datas acontecidas no ano de 1968. Com o mundo em ebulição em plena Guerra Fria, movimentações políticas apresentaram à população dados não muito agradáveis para serem lembrados no decorrer dos tempos.

A Guerra do Vietnã quase adentrava em seu décimo ano, com as tropas americanas invadindo o território de Saigon. Enquanto a invasão dos Estados Unidos prosseguia, os estudantes norte-americanos prosseguiam seus protestos contra a carnificina ocidental, mas a guerra ainda estaria longe de acabar.

Neste ano, o mundo perdeu também Martin Luther King, e a luta pela igualdade social teve um ativista a menos para batalhar pela paz entre os homens - assassinado a mando de pessoas que mantinham a idéia de segregração racial. Nos Estados Unidos, outro atentado matou Robert Kennedy, na Califórnia.

Mas o ano que não terminou guardava ainda algumas gratas surpresas. As Ilhas Maurício e a Suazilândia se tornaram países independentes, e este ano se tornaria um marco para o cinema, com o lançamento de 2001 - A odisséia do espaço, de Stanley Kubrick.

O Brasil também vivia momentos alarmantes, em uma cronologia que anunciava os tempos obscuros que viriam a partir de 1968. Ainda tendo no poder o general Artur da Costa e Silva, aos poucos a Ditadura Militar afiava suas garras, tornando-se cada vez mais repressora e sem limites em seus atos: a 28 de março, o estudante Edson Luiz de Lima Souto, de 16 anos, foi assassinato no restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro - e, ao contrário do que se supunha, o menino não participava de lutas armadas.

O incidente criou uma mobilização social, apresentada politicamente através do deputado Márcio Moreira Alves. Em 3 de setembro, o jornalista (pertencente ao MDB, então partido de oposição ao governo - a "situação" do poder era representada pela sigla ARENA) apresentou um discurso em oposição áspera aos militares. Moreira Alves teve seus direitos cassados.

No dia 13 de dezembro de 1968, o presidente Artur da Costa e Silva decretou o Ato Institucional Número 5 - AI-5. Com o novo ato, estavam instituídos o fechamento do Congresso, a intervenção em estados e municípios, a permissão de o presidente decretar estado de sítio, suspensão do habeas-corpus para crimes políticos, além de impor a censura prévia.

A Música Popular Brasileira passaria a precisar de novas artimanhas para ter seu direito de se expressar em letra e música. Artistas como Chico Buarque, Caetano Veloso e Geraldo Vandré seriam alguns nomes conhecidos a conviver com perseguições políticas e a censura implacável.

Em meio a este panorama, Roberto Carlos vivia sua própria revolução. Depois de encerrado o doce período das "jovens tardes de domingo", quando o programa Jovem Guarda teve seu fim decretado graças à superexposição da mídia que tanto ajudara sua disseminação, ele agora buscava novos ares, novos caminhos musicais.

E seu barco foi aportar em San Remo, de onde trouxe o prêmio máximo do festival apresentado na cidade, graças à interpretação de Canzone per te, bela música de Sergio Endrigo e Sergio Bardotti. O show da era "jovem-guardista" já tinha terminado, era hora de voltar à realidade de um cantor em busca de sua verdade. E eis que, em meio a tantos sósias e pretendentes de seu lugar no cenário musical brasileiro, Roberto Carlos se declarou O inimitável, apresentando em 12 músicas tudo o que sabia cantar e fazer.

Do romantismo de E não vou mais deixar você tão só e Ninguém vai tirar você de mim, passando pela dor-de-cotovelo de Não há dinheiro que pague, O tempo vai apagar e Quase fui lhe procurar, as declarações de amor exaltadas de Eu te amo, te amo, te amo e quase infantis como em É meu, é meu, é meu, a doce balada As canções que você fez pra mim, as raivosas Nem mesmo você e Ciúme de você, a introspecção de Madrasta. Todos os estilos de música atendiam pelo nome de Roberto Carlos.

E foi na voz da soul music que RC deixou sua marca em 1968, o ano que não terminou. Em música assinada em parceria com Erasmo Carlos, Roberto mostrava que daqui pra frente tudo seria - e foi - diferente. E comprovava que, em letra, música e novos caminhos de seu repertório, o bom é ser feliz e mais nada.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos em um raro registro, do fugaz momento em que usou bigode. Coisas de 1968, o ano que não terminou.

Abraços a todos, Vinícius.

SE VOCÊ PENSA - Roberto e Erasmo

Se você pensa que vai fazer de mim
O que faz com todo mundo que te ama
Acho bom saber que pra ficar comigo
Vai ter que mudar...

Daqui pra frente
Tudo vai ser diferente
Você tem que aprender a ser gente
O seu orgulho não vale nada, nada...

Você tem a vida inteira pra viver
E saber o que é bom e o que é ruim
É melhor pensar depressa e escolher
Antes do fim

Você não sabe
E nunca procurou saber
Que quando a gente ama pra valer
Bom mesmo é ser feliz e mais nada, nada

Nada, nada...

quinta-feira, 1 de maio de 2008

As décadas de Roberto Carlos - Anos 2000




Olá, amigos.

Com o post de hoje, este blogue encerra sua série As décadas de Roberto Carlos, que falou sobre cada uma das décadas em que RC teve destaque em letra, música e obra no cenário musical. Hoje, mostramos a atual década que estamos vivendo - os anos 2000, o primeiro decênio do século XXI.

Ao contrário do que muitos especialistas tecnológicos anteviam, o bug do milênio não aconteceu no universo cibernético. As precauções foram tomadas para que não houvesse um "retrocesso" na memória dos computadores - que, em vez de passar de 1999 para 2000, corria o risco de retornar a 1900, causando transtornos em vários setores. Artigo de luxo em seus primeiros anos de existência, o computador hoje é comercializado em preços mais populares. A conexão através da Internet também se popularizou, e hoje a conexão denominada "banda larga" é presente em boa parte do mundo - o que torna instantânea a repercussão de qualquer acontecimento no universo.

Buscando cada vez mais a comunicação através de "um clique", a rede mundial de computadores viu o surgimento de endereços eletrônicos destinados a relacionamentos - o mais popular desta década é o Orkut. Este que vos escreve é um dos que agradece pela criação da Internet, pois, se não fosse por ela, hoje vocês não estariam lendo este texto na tela de computador.

O sistema da Internet proporcionou outros avanços. Pouco tempo depois de substituir os discos de vinil, o Compact Disc (CD) já parece estar com os dias contados, graças ao surgimento das músicas formatadas em MP3 - com a conexão no modo "banda larga", já se pode baixar gravações de discos e até mesmo DVDs (o DVD tornou definitivamente obsoleto o VHS) em poucos minutos, e de graça. Este é o ônus do avanço tecnológico para gravadoras e artistas, que perdem muito dinheiro de direitos autorais, e vêem a venda do mercado fonográfico despencar ano a ano. O reflexo deste panorama pode ser visto, inclusive, nos números de Roberto Carlos - seus lançamentos anuais vendiam cerca de 1,5 milhão de cópias na década de 1980, e seu trabalho de 2005 chegou ao número de 350 mil cópias vendidas (o que é considerado um ótimo índice de vendas no panorama das gravadoras brasileiras).

Definido pela ONU como o Ano Internacional da Paz, o ano de 2000 teve, no mês de dezembro, um fato que comprometeria o ideal de um período pacífico: o eleitorado norte-americano elegeu George W. Bush para o cargo de presidente dos Estados Unidos. Assim como ocorrera com o pai na década anterior, Bush conviveu com atritos militares contra países do Oriente Médio.

O primeiro deles veio em 11 de setembro de 2001. Muçulmanos adestrados pelo afegão Osama bin Laden, líder do Al-Qaeda seqüestraram aviões que atingiram o Pentágono (base militar norte-americana) e as torres gêmeas do World Trade Center (considerado o centro da economia americana). O clima de terrorismo tomou conta da cena deste início de milênio, e Bin Laden se tornou o homem mais procurado do mundo - e o responsável por destruições dignas de efeitos especiais do cinema americano.

Dois anos depois, W. Bush seguiu os passos do pai, e voltou suas atenções contra o Iraque, num ataque repudiado por vários países e que terminou numa vitória inglória: após as mortes de ambos os lados e a humilhação que soldados americanos fizeram prisioneiros do Iraque passar, enfim o ditador Saddam Hussein foi capturado - era o fim de uma ditadura de 34 anos. No ano de 2006, Saddam foi condenado à forca, e as imagens de sua execução vazaram na Internet, num espetáculo lamentável. E as armas de destruição de massa que eram o pretexto para a ocupação dos Estados Unidos no Iraque não foram encontradas.

Os anos 2000 mostraram o fim de outras "eras" na política internacional. Em 2004, morreu o líder árabe Yasser Arafat. E, 49 anos depois de chegar ao poder, o líder Fidel Castro saiu da presidência de Cuba, pelo agravamento de seus problemas de saúde. No entanto, o contexto político da América Latina apresentou dois políticos que se destacam por suas atitudes polêmicas: Evo Moralez, presidente da Bolívia, e Hugo Chávez, presidente da Venezuela.

O terror não se restringiu à região dos Estados Unidos: em Madrid, no ano de 2004, um atentado assustou os espanhóis, e, na escola primária de Beslan, na Rússia, crianças se tornaram reféns de bandidos em momentos que comoveram o universo. Mas a maior comoção certamente viria no ano de 2005: faleceu o Papa João Paulo II, que durante seu pontificado acenou com a tentativa de uma paz entre os católicos e outras religiões. No mês seguinte, o cardeal Joseph Ratzinger se tornou o Papa Bento XVI - e ficou marcado por declarações infelizes como o veto ao uso de preservativos e o não-reconhecimento aos muçulmanos.

O início de década no Brasil trouxe uma das melhores atitudes que o presidente Fernando Henrique Cardoso tomou em seus oito anos de mandato: condecorar Roberto Carlos com uma medalha de honra ao mérito. Depois de ter em seu segundo mandato convivido com oscilações do dólar e as crises das bolsas norte-americanas, FHC não conseguiu eleger seu candidato - o seu ex-ministro da Saúde, José Serra.

Nas eleições de 2002, o petista Luiz Inácio Lula da Silva recebeu o aval para sentar na cadeira mais importante do país, em uma vitória vista por muitos como "a primeira alternância de poder depois de 502 anos de Brasil". Realizando projetos como o Fome Zero, Lula foi alvo de muitas críticas até mesmo de antigos aliados, que enxergavam em algumas de suas medidas uma continuidade do que tinha sido realizado na "Era FHC".

Alianças políticas com sinônimos de "coronelismo", casos de José Sarney e Antônio Carlos Magalhães, fizeram com que alguns políticos da área mais radical do Partido dos Trabalhadores rompessem as relações políticas e criassem o PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), liderado por Heloísa Helena. O governo Lula teria outro momento de abalo: em 2005, o deputado Roberto Jefferson denunciou a existência do "mensalão" - quantia que alguns deputados receberiam para apoiar a aliança do governo em votações no Congresso. "Cortando na própria carne", o governo assistiu ao afastamento do ministro da Casa Civil, José Dirceu, do ministro da Fazenda, Antônio Palocci, e de outros deputados que faziam parte da base do governo.

Mesmo com outros incidentes políticos, como a Máfia dos Sanguessugas (quadrilha que desviava dinheiro público originalmente liberado para a compra de ambulâncias) e o episódio do homem que trazia dólares em sua cueca, Lula conseguiu se reeleger na corrida eleitoral de 2006, em vitória sobre o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin. Agora tendo à frente da Casa Civil a ministra Dilma Rousself, a tônica do segundo mandato é o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

A década ainda não acabou mas já trouxe episódios tristes "herdados" do final do século passado. A violência urbana segue amedrontando a população - as trocas de tiros entre traficantes e policiais que fazem parte do dia-a-dia do Rio de Janeiro e ações da facção PCC aterrorizando os moradores de São Paulo foram alguns dos destaques da mídia, além de constantes rebeliões em presídios de todos os cantos do país. Na saúde, o Brasil convive com a batalha contra o mosquito Aedes Aegypti, transmissor da dengue, que assola a capital fluminense.

Outros episódios violentos chamaram atenção da população. No Rio de Janeiro, o ano 2000 foi marcado pelo seqüestro do ônibus 174, no bairro do Jardim Botânico. Em 2001, o apresentador e dono do SBT Sílvio Santos conviveu com dois dramas em poucos dias: sua filha Patrícia foi alvo de seqüestradores e, dias depois de ela ser libertada, foi a vez dele se tornar refém do bandido.

No ano seguinte, a adolescente Suzanne von Richtofen, ao lado de seu namorado e do irmão dele, matou os pais num crime premeditado em São Paulo. E nos anos de 2007 e 2008, foi a vez de crianças se tornarem símbolos de uma sociedade marcada pela violência e pela mesquinhez: no ano passado, o menino João Hélio ficou preso ao cinto de segurança de seu carro, e bandidos ansiosos pelo roubo arrastaram o menino por metros nas ruas do Rio de Janeiro. E, no mês passado, a menina Isabela Nardoni comoveu o país depois que foi misteriosamente jogada da janela do apartamento em que moravam seu pai, a madrasta e seus irmãos, num crime acontecido em São Paulo e até o momento sem esclarecimentos.

O futebol brasileiro segue com a mesma tendência apontada nos anos 90: os jogadores começam a despontar e logo acertam sua transferência para o exterior - mas, desta vez, além de Itália, França, Inglaterra e Japão, os mercados dos países árabes e do Leste Europeu também são consideradas vitrines para jogadores que querem uma convocação para a Seleção Brasileira. Em 2007, o país assistiria a mais uma consagração de um artilheiro: o atacante Romário chegou ao gol mil de sua carreira, marcado de pênalti na partida em que o time que defendia, o Vasco, derrotou o Sport por 3 a 1, no estádio de São Januário.

Nas duas Copas do Mundo realizadas até agora, a Seleção Brasileira alternou um grande momento com uma desilusão terrível. Em 2002, o time comandado por Luiz Felipe Scolari partiu rumo ao primeiro torneio realizado simultaneamente em dois países (Japão e Coréia) sob fortes críticas - em especial pelo treinador ter preterido o atacante Romário e apostar em Ronaldo, que vinha de constantes contusões. Tendo jogadores como Rivaldo, Denílson, Cafu, Roberto Carlos (sim, homônimo de RC) e Ronaldinho Gaúcho, o Brasil retornou da Ásia com mais um título, após a vitória por 2 a 0 sobre a Alemanha, com dois gols de Ronaldo.

Já em 2006, sob o comando de Carlos Alberto Parreira, a Seleção Brasileira apresentou desde o início um futebol aquém do que a constelação de craques prometia trazer aos olhos do futebol mundial. Aliado a jogadores de destaque no torneio anterior, vinham promessas como Kaká, Adriano e Robinho, e o melhor jogador do mundo, Ronaldinho Gaúcho. Mas, após vitórias inexpressivas na primeira fase e nas oitavas-de-final, o Brasil novamente caiu aos pés da França comandada por Zidane, e voltou da Alemanha depois da derrota por 1 a 0 nas quartas-de-final. A Itália venceria a seleção francesa nos pênaltis e seria campeã.

A televisão brasileira, tão marcada por suas experiências na teledramaturgia, inseriu em seu início de milênio a "novela da vida real". Seguindo formato da televisão holandesa, entrou no ar a partir de 2002 o Big Brother Brasil, atração na qual 12 participantes (mais tarde o número foi elevado para 14) ficam confinados em uma casa durante meses, e vence o que é mais simpático aos olhos do público. Até o atual momento, são oito edições deste reality show - linha de espetáculo muito difundida na TV brasileira.

No mesmo estilo passaram pelo controle remoto outros programas - a Casa dos artistas (SBT), No limite (TV Globo) e O aprendiz (TV Record) são alguns deles. E, depois da tentativa de ressuscitar o Festival da Música Popular Brasileira, a TV Globo importou um formato de reality show com aspirantes a cantores - o Fama, que durou apenas três edições. Aproveitando também um programa estrangeiro, o SBT também investiu em buscar novos talentos para a música, no programa Ídolos (agora, os direitos do programa estão com a TV Record). Em 2003, um ícone da televisão nos deixou: Roberto Marinho, dono das Organizações Globo.

A música mundial trouxe novamente a presença do hip-hop dentre os ritmos favoritos, mas cedeu espaço a um rock considerado mais melódico, feito por bandas como Dragonforce, Edguy e Rhapsody of Fire. Também teve destaque a música feita por artistas que seguem um "jeito de ser" muito peculiar: os EMO - musicalmente, derivado do estilo punk, mas que trazem em suas letras um tom mais emocional, apresentado pelas bandas Simple Plan e Paramore.

A discografia brasileira trouxe alguns seguidores deste estilo de ser, caso das bandas NX Zero e Detonautas. O pop/rock e o samba-reggae prosseguem tendo destaque nas rádios, além da proliferação constante dos funks cariocas - nos estilos musicais citados anteriormente, apareceram em evidência nomes como CPM 22, Jota Quest e MC Leozinho. No samba, ainda se destaca o nome de Zeca Pagodinho, em especial depois que ele se tornou garoto- propaganda da cerveja Brahma, e a entrada de Maria Rita, filha da cantora Elis Regina, na lista de intérpretes da Música Popular Brasileira. Ainda teve espaço para o movimento dos Tribalistas - disco formado por Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown.

Mas a boa Música Popular Brasileira ainda sobrevive. Maria Bethânia vem apresentando discos fantásticos, com feituras muito bem trabalhadas e resultados fascinantes ao ouvido do grande público. O "mano" Caetano Veloso prossegue, agora aos 60, tentando se renovar em seu jeito tropicalista de ser, e recentemente lançou o álbum experimental . Depois de oito anos sem gravar um disco totalmente seu (neste meio tempo suas participações como cantor ou compositor eram esporádicas, em discos de outros artistas), Chico Buarque voltou a mostrar que é um grande compositor através do belo disco Carioca (que rendeu, em seguida, o disco Carioca ao vivo).

Os anos 2000 trouxeram também vôos solos de artistas ligados musicalmente a Roberto Carlos - naturalmente, isto não significa que ambos deixaram de lado seus trabalhos com RC. Respeitando a impossibilidade de Roberto Carlos colaborar com suas novas músicas, Erasmo Carlos teve a parceria de Marisa Monte e Carlinhos Brown (e o encontro com ela na faixa que fizeram - Mais um na multidão) e assinou canções sozinho para seu disco Pra falar de amor, em 2001 (dentre as faixas, houve espaço também para parceria com seu arranjador, José Lourenço) - na esteira do disco, veio o DVD Erasmo Carlos ao vivo (também em CD), em 2003. Depois, o Tremendão foi mais radical ainda: em 2004, Santa Música, as 12 faixas tiveram no crédito de autoria apenas o nome de Erasmo Carlos. E em 2007 viria mais um inspirado momento musical brasileiro que Erasmo apresentou: Erasmo Carlos convida - Volume II, segunda leva de encontros com artistas de todas as gerações e todos os estilos. Dedicando o disco ao parceiro Roberto, Erasmo dividiu vocais com contemporâneos como Chico Buarque e Milton Nascimento, e artistas de gerações posteriores, casos de Marisa Monte e Adriana Calcanhotto e dos grupos Kid Abelha, Los Hermanos e Skank.

Outro nome muito associado a RC que se destacou em trabalhos solo foi o maestro Eduardo Lages. Desde 2005, Eduardo vem apresentando grandes interpretações como pianista, arranjador e produtor. O primeiro trabalho, Emoções, foi dedicado à obra assinada por Roberto Carlos e Erasmo Carlos. No ano de 2006, com Cenário, ele abriu espaço para, além de músicas da safra de RC, fazer leituras para canções de Elvis Presley, Beatles, ABBA e Stevie Wonder. No ano passado, Lages gravou seu primeiro DVD (e seu terceiro disco), intitulado Com amor, gravado ao vivo no Teatro Municipal de Niterói e dedicado "ao maior cantor popular do Brasil... Roberto Carlos". Trabalhos que comprovam como RC está bem acompanhado.

Roberto Carlos começou a década voltando agora pra ficar, porque ali, ao lado da música e de seus milhões de amigos que o seguem desde o começo de sua carreira, é o seu lugar. No dia 11 de novembro de 2000, RC voltou a se apresentar num palco, trazendo um novo show que reflete explicitamente o que sente por sua amada Maria Rita - Amor sem limite. No mês seguinte, chegaria às lojas seu novo trabalho, um disco introspectivo também batizado de Amor sem limite, que em cada canção (assinada apenas por ele) se deitava em detalhes tão pequenos de uma relação a dois que gerava um amor sem limite, maior e mais forte que existe. Além da canção que dá nome ao disco, as faixas O grande amor da minha vida, O grude (um do outro), O amor é mais e a inclusão de três gravações anteriores a 2000 formavam uma safra de músicas dedicadas a Maria Rita: Eu te amo tanto, Quando digo que te amo e Mulher pequena. As canções feitas por outros autores (Tudo, de Martinha, e Momentos tão bonitos, de Eduardo Lages e Paulo Sérgio Valle) assimilaram a tônica pretendida por RC para o seu álbum da volta - que ainda teve espaço para uma canção religiosa (assinada com Erasmo): Tu és a verdade, Jesus. A partir deste disco, Guto Graça Mello se juntou a Mauro Motta na produção musical de Roberto Carlos.

2001 apresentou um Roberto Carlos aos 60 anos mas se aproximando do público jovem - foi sua vez de lançar o Acústico MTV, com 14 releituras de sucessos colecionados por uma carreira extensa em grandes obras prestadas à Música Popular Brasileira. Seu primeiro DVD foi o trabalho mais "esperado" de sua carreira - gravado em maio, não pôde ser lançado antes por conta de um atrito entre a TV Globo (detentora dos direitos de imagem de RC desde 1974, ano em que apresentou seu primeiro especial anual) e a MTV (responsável pelo programa) e pelo perfeccionismo de Roberto, cada vez mais convivendo com o Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC). O TOC fez com que ele alterasse versos de suas canções, caso de É preciso saber viver - na qual o verso "se o bem e o mal existem" foi substituído por "se o bem e o bem existem" até os shows do ano passado.

No ano seguinte, ainda descontente com as faixas de seu próximo trabalho, RC cancelou o trabalho que lançaria, e em seu lugar foi lançado um disco reunindo 11 canções de seu show realizado no Aterro do Flamengo, em comemoração pelos 90 anos do Bondinho do Pão de Açúcar, versões em remix de Se você pensa e O calhambeque, e a inédita Seres Humanos. O rap, assinado com Erasmo Carlos, mostrou um Roberto Carlos valorizando as coisas que o homem tem feito, como os progressos na ciência e as invenções do avião e do telefone. Causou polêmica também o verso "buscamos apoio nas religiões e procuramos verdades em suposições", além de dizer que todos nós somos filhos de Deus, independente das religiões.

Em 2003, veio um novo disco dedicado a interpretar canções de amor bem sucedidas. Outra coisa em comum nas músicas românticas foi que traziam assinatura apenas de Roberto Carlos - Todo mundo me pergunta, Acróstico, Com você, O encontro e a faixa que dá título ao disco: Pra sempre. A parceria com Erasmo Carlos, além da faixa que apareceu como um bônus no disco do ano anterior, veio também na nostálgica O Cadillac. O disco ficou completo com músicas de Mauro Motta e Carlos Colla, Lula Barbosa e Pedro Barezzi e Eduardo Lages e César Augusto (respectivamente, Como eu te amo, História de amor e Eu vou sempre amar você), também de amor que não rima com dor.

2004 traria pela primeira vez um registro de um show na íntegra de Roberto Carlos (o Ao vivo de 1988 trazia apenas 10 números, e o Acústico MTV não era um show de carreira dele): Pra sempre ao vivo no Pacaembu. No ano seguinte, novamente RC apresentaria um disco de estúdio, mas diferente de todos os discos de sua carreira: o trabalho apresentava basicamente leituras suas de canções de destaque em vários cenários musicais (Promessa, sua e de Erasmo, gravada por Wanderley Cardoso no período da Jovem Guarda, a neo-sertaneja Coração sertanejo, a guarânia Índia e a belíssima Loving you, do repertório de Elvis Presley), três regravações de seu repertório (Meu pequeno Cachoeiro, O baile da fazenda e O amor é mais) e a inédita (que demorou 14 anos para escrever com Erasmo Carlos) Arrasta uma cadeira, para dividir os vocais com a dupla Chitãozinho & Xororó. Em 2006, RC adiaria o lançamento de um novo trabalho inédito, mas deixaria seu público na companhia de bons momentos da sua carreira - o disco e o DVD Duetos, que apresenta encontros musicais que ele teve no decorrer de seus Roberto Carlos Especial na TV Globo.

Outros produtos seriam lançados para revisitar a carreira de RC: a coleção Pra sempre, reunindo sua obra entre as décadas de 1960 e 1990 (até o momento), além de duas caixas dedicadas a seus discos lançados apenas para o mercado latino (que, informalmente, se tornou seu lançamento de 2007, já que o "disco inédito" não aconteceu). Roberto também passou a investir em apresentações anuais (geralmente no mês de fevereiro) durante programações de um cruzeiro marítimo - o Projeto Emoções em Alto Mar. Roberto também investiu em mercados bem distantes da música - o gado, e, recentemente, associando seu nome à marca de perfumes Racco. Como apresentamos em um dos posts anteriores, o perfume feminino Emoções já está nas perfumarias de várias capitais do Brasil e do mundo.

A década de 2000 ainda não terminou, mas o que se pode ver é que, ano após ano, RC mostra o quanto guarda o que há de bom nele para dar a seu público quando ele chega a seus shows ou quando ele escuta seus discos. Grande demais é o amor sem limite entre Roberto Carlos e seus fãs, e não há destino que separe esta certeza. Como diz a canção que ele e Erasmo escreveram para a dupla da Jovem Guarda Os Vips gravar em 1965 e que, 40 anos depois, Roberto deu sua versão - lançada antes de dezembro, para fazer parte da trilha musical de América, então novela das 21h da TV Globo.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos durante sua apresentação no Acústico MTV.

Abraços a todos, Vinícius.

A VOLTA - Roberto e Erasmo

Estou guardando o que há de bom em mim
Para lhe dar quando você chegar
Toda ternura e todo meu amor
Estou guardando pra lhe dar

E toda vez que você me beijar
A minha vida quero lhe entregar
Em cada beijo, certo ficarei
Que você não vai me deixar

Grande demais foi sempre o nosso amor
Mas o destino quis nos separar
E agora que está perto o dia de você chegar
O que há de bom vou lhe entregar

Só vejo a hora de você chegar
Pra todo meu amor poder mostrar
Mas quando eu, de perto te olhar
Não sei se vou poder falar

Estou guardando o que há de bom e mim
Para lhe dar quando você chegar...