quarta-feira, 27 de maio de 2009

50 anos de emoções - 1978



Olá, amigos.

A série 50 anos de emoções continua sua trajetória, mostrando ano a ano cada detalhe das emoções da carreira de Roberto Carlos. Esta é a forma para homenagear o cinquentenário de sua carreira artística, comemorado neste 2009 com uma turnê de shows e alguns tributos. O mais recente deles aconteceu ontem, quando 20 cantoras se reuniram no espetáculo "Elas cantam Roberto", em São Paulo. Este show foi gravado e será um especial da TV Globo a ser exibido no próximo domingo, depois do Fantástico.

O ano de 1978 ficou marcado por um grave incidente que ocorreu movido pelo fanatismo religioso. Na Guiana, um grupo de seguidores da seita "O Templo do Povo", liderada pelo reverendo Jim Jones, foi encontrado morto num acampamento. O pastor estava sendo investigado por políticos norte-americanos por acusações de tortura a homens, mulheres, crianças e animais em sua comunidade, chamada de Jonestown. De acordo com a perícia, os seguidores foram obrigados a tomar um suco de laranja misturado a cianureto e analgésicos. O "Massacre de Jonestown" resultou em 912 mortos - dentre eles, Jim Jones, que foi encontrado morto com uma bala na cabeça.

A Igreja Católica teve uma alteração em seu pontificado. Em agosto, o Papa Paulo VI morreu depois de 15 anos como pontífice. 20 dias depois, o cardeal Albino Luciani se tornou o Papa João Paulo I. Mas, após 33 dias à frente do Vaticano, o novo Papa também faleceu. Em 16 de outubro, a igreja revelou o nome do novo pontífice: o cardeal polonês Karol Józef Wojtyla, conhecido como o Papa João Paulo II.

O Brasil deu um grande passo no retorno à sua democracia. No último dia de 1978, o presidente Ernesto Geisel apresentou uma emenda constitucional que revogou o Ato Institucional Número 5. Com o fim deste ato institucional, novamente a lei permitiu o habeas corpus.

Novamente, a Seleção Brasileira voltou de uma Copa do Mundo sem um título. No torneio, realizado na Argentina, o Brasil teve um resultado razoável na primeira fase - empates contra Suécia (1 a 1) e Espanha (0 a 0) e um magro 1 a 0 diante da Áustria, com uma situação curiosíssima no empate contra os suecos: a partida estava em seu finzinho quando Zico aproveitou uma cobrança de escanteio e cabeceou a bola para o fundo das redes. Só que o árbitro tinha encerrado a partida enquanto a bola estava no ar, e o gol foi anulado.

Na segunda fase, o Brasil venceu o Peru por 3 a 0 e teve um empate sem gols contra a anfitriã Argentina. À Seleção Brasileira bastava uma vitória, pois o time tinha melhor campanha e jogava contra a fraca seleção da Polônia, enquanto a Argentina precisaria fazer uma vitória diante do Peru que a deixasse com um saldo de gols maior do que o do Brasil. Misteriosamente, em vez das duas partidas serem em horários iguais (como previa o regulamento), o jogo entre Argentina e Peru foi transferido para duas horas depois de Brasil e Polônia. A Seleção Brasileira venceu a Polônia por 3 a 1 e, com isto, os argentinos precisariam vencer por, no mínimo, quatro gols de diferença. Num jogo marcado por muitas falhas do goleiro peruano, a Argentina conseguiu uma goleada por 6 a 0 e se classificou para a final da Copa do Mundo.

Ao Brasil, restou a terceira posição (conquistada depois da vitória por 2 a 1 diante da Itália, na decisão do terceiro lugar) e a emblemática frase do treinador Cláudio Coutinho, que afirmou que o Brasil era "o campeão moral desta Copa do Mundo". No campo, a anfitriã Argentina conquistou seu primeiro título, após um empate em 1 a 1 no tempo normal e uma vitória por 2 a 0 na prorrogação. Mais uma vez, a Holanda foi derrubada na final do torneio.

Assim como acontecera cinco anos antes, a decisão do Campeonato Brasileiro foi entre dois times paulistas. O torneio foi mais inchado do que o ano anterior - desta vez, com 74 clubes, e as fórmulas de disputa previam primeira, segunda e terceira fase, além de quartas-de-final, semifinal e final. Só que, pela primeira vez na competição, o campeão seria conhecido após duas partidas entre os melhores do Brasil.

O Guarani surpreendeu o Palmeiras e, no Morumbi, venceu o primeiro jogo por 1 a 0, com gol de Zenon. Na partida decisiva, realizada no Estádio Brinco de Ouro da Princesa (em Campinas), a revelação Careca fez o gol da vitória do Bugre. O alviverde campineiro conquistou seu primeiro título nacional.

Roberto Carlos passou a ter um novo arranjador a partir de 1978: no lugar de Chiquinho de Moraes, ele começou a ter seus show sob a batuta do maestro Eduardo Lages. Com Lages, Roberto iniciou uma nova temporada no Canecão: o show Palhaço. Eis o repertório:

Abertura instrumental: Jesus Cristo / O calhambeque / Quero que vá tudo pro inferno / Falando sério / Se você pensa
Amigo
Falando sério
Seu corpo
Proposta
Um jeito estúpido de te amar
Olha
Os seus botões
Café da manhã

Detalhes
Poema "Todas as cartas de amor são ridículas", de Fernando Pessoa
Outra vez
Não Se esqueça de mim
Música suave
Poema "O guardador de rebanhos", de Fernando Pessoa
Força estranha
Cavalgada
For once in my life
Texto de Ronaldo Bôscoli
O Show já terminou


RC surpreendia o público, se apresentando vestido de palhaço. Uma tentativa que Miéle, depois de alguns anos, comentou: "Na época, a gente teve a ideia do Roberto vestir de palhaço, mas eu falei pro Ronaldo Bôscoli: 'olha, se não der certo, o Roberto Carlos vai continuar sendo Roberto Carlos, mas a gente vai começar a produzir shows no Peru, na Bolívia'...".

Só que deu muito certo, não só por um repertório extenso - no qual curiosamente não entrou nenhuma música de Jovem Guarda - mas também pela valorização de Roberto Carlos como artista. Além de cantar, RC declamou dois poemas de Fernando Pessoa - Todas as cartas de amor são ridículas, que antecedeu Outra vez, e O guardador de rebanhos, que veio antes de Força estranha. Houve espaço também para a interpretação de For once in my life, clássica canção americana que recebeu leituras de nomes como Stevie Wonder e Frank Sinatra.

Mas a homenagem aos palhaços certamente foi a maior emoção do show que começou a ser apresentado no Canecão em novembro de 1978. "O símbolo de um herói colorido. Cuja arma é o sorriso", como disseram as palavras de RC. Ronaldo Bôscoli publicaria um depoimento da Revista Manchete sobre o final do show:

"O show vai terminar. Roberto, de frente para o público, começa o corajoso ritual. Compõe, com elementos colocados em cena, seu próprio palhaço. Suas mãos não vacilam. Nenhum rictus na face. Canta O show já terminou. Uma discreta lágrima brota-lhe na face. Quase imperceptível. Termina o espetáculo. Aplausos e cortina engolem Roberto Carlos. Ele corre para o camarim. E desabafa no colo materno um pranto convulso."

Graças a um arquivo de áudio disponibilizado na Internet, este blogue transcreve para vocês abaixo o texto final do show Palhaço, no qual RC disse as seguintes palavras:

Sou... mas quem não é? Sou e assumo! E só assim com cara de palhaço, descobri que os homens, antes de poluirem os ares e os mares, começaram a poluir as próprias palavras...

Cabeças muito encucadas fizeram do palhaço uma ofensa. "Seu palhaço!" Não é nada disso... Vocês sabem o que é realmente um palhaço? Cadê grandeza bastante pra tudo isso? Crises de palhaço todos nós temos! De repente, no Natal, a gente rouba uma verdade, veste um palhaço e acabou!

Eu já fui palhaço no meu ofício, vocês se lembram? "Vista a roupa, meu bem! Vista a roupa, meu bem! Vista a roupa, meu bem!"...

Eles sim. São e foram os grandes e heroicos palhaços atirando suas cores contra o preto e branco do cotidiano. Eu fui cavalo do meu rei, o Segundinho. Fui bobo da corte pra minha princesa Ana Paula. E num gesto de careta jogado ao acaso, minha filha Luciana aprendeu a rir...

Mas isso são apenas crises de palhaço. Quem sou eu pra ser palhaço mesmo? Mas eu preciso rolar a bola do mundo pra que ela se faça colorida pela primeira vez numa flor?

E um instante de palhaço dura exatamente uma eternidade! Um instante de palhaço dura exatamente uma eternidade! Exatamente uma eternidade...

Pra mim...

O show já terminou
Vamos voltar à realidade
Não precisamos mais
Usar aquela maquiagem
Que escondeu de nós
Uma verdade que insistimos em não ver
Não adianta mais
Chorar o amor que já tivemos
Existe em nosso olhar
Alguma coisa que não vemos
E nas palavras
Existe sempre alguma coisa sem dizer

E é bem melhor que seja assim
Você sabe tanto quanto eu
No nosso caso felicidade
Começa num adeus

Mas o show já terminou
Vamos voltar à realidade
Não precisamos mais
Usar aquela maquiagem
Que escondeu de nós
Uma verdade que insistimos
Em não ver

Nosso show já terminou

Nosso show já terminou...


Mas o show não tinha ainda terminado. O final de ano reservou um Roberto Carlos Especial especialíssimo para todos. Roberto Carlos ficou no ar por 24 horas, entre os dias 17 e 18 de dezembro. Ele foi o apresentador de um projeto ambicioso da Rede Globo, que valorizou o Ano Internacional da Criança e fez uma campanha que contou com a adesão de vários espectadores. Este programa foi um "embrião" para o projeto anual do Criança Esperança. Roberto apresentou nos dois dias, mas somente por cerca de uma hora ficou com um programa exclusivamente para ele. Além de receber Erasmo Carlos e relembrar a homenagem de Amigo no ano anterior, Roberto dividiu os vocais com Wanderléa para cantarem Ternura, recebeu a atração internacional Fredy Cole, que o acompanhou ao piano para ele interpretar For once in my life e teve o piano de Tom Jobim para os dois interpretarem Lígia.

Houve espaço para as recordações, através do depoimento de moradores de Cachoeiro - dentre eles, a primeira professora de Roberto Carlos. Ao final, o programa ganhou uma tônica religiosa, com o depoimento de Dom Paulo Evaristo Arns e RC interpretando as músicas Jesus Cristo e , acompanhado do Coral da Universidade Gama Filho. foi a "mensagem" que teve a responsabilidade de abrir o LP de 1978. Um disco que trouxe mais canções fantásticas para o repertório de RC:

LADO A

1 - , de Roberto Carlos e Erasmo Carlos

2 - A primeira vez, de Roberto Carlos e Erasmo Carlos

3 - Mais uma vez, de Maurício Duboc e Carlos Colla

4 - Lady Laura, de Roberto Carlos e Erasmo Carlos

5 - Vivendo por viver, de Márcio Greyck e Cobel

LADO B

1 - Música suave, de Roberto Carlos e Erasmo Carlos

2 - Café da manhã, de Roberto Carlos e Erasmo Carlos

3 - Tente esquecer, de Isolda

4 - Força estranha, de Caetano Veloso

5 - Por fin mañana
, de Armando Manzanero

6 - Todos os meus rumos, de Fred Jorge

Roberto Carlos lançou mais uma dupla de compositores - Cobel e Márcio Greyck (este último ficaria conhecido pelo sucesso Impossível acreditar que perdi você). Sete anos depois de Debaixo dos caracóis dos seus cabelos, Roberto colocou em disco uma gravação para Força estranha, retribuição em letra e música de Caetano Veloso para ele. E mais uma canção que parece feita sob medida para RC. A dupla Maurício Duboc e Carlos Colla, a compositora Isolda e o compositor Fred Jorge continuaram presentes, e este acabou assinando a música que encerra o LP aparentemente por acidente.

Roberto Carlos anunciou que uma das gravações de 1978 seria sua leitura para a belíssima Cálice, de Chico Buarque e Gilberto Gil. Entretanto, a música não saiu, e há indícios de que, de fato, ela foi gravada. O LP de RC pela primeira vez saiu com 11 músicas e, por causa da exclusão de Roberto, Chico teria incluído ela em seu LP daquele mesmo ano - na gravação feita com participação de Milton Nascimento e do grupo MPB-4. Comenta-se que esta interpretação de RC para Cálice está nos arquivos da CBS (agora Sony & BMG), e que ele teria deixado de fora do disco por causa do verso "de que me vale ser filho da santa, melhor seria ser filho da outra".

Um verso bem paradoxal, levando em conta que no mesmo LP Roberto apresentaria uma homenagem primorosa à sua mãe, em Lady Laura. Roberto e Erasmo arriscaram passear pelo fox e, através de Música suave, fazer muita gente dançar de rostinho colado, além de apresentar um amor inocente nos versos de A primeira vez.

Só que a vertente amorosa mais latente na safra de Roberto e Erasmo continuava trazendo muita sensualidade. E mais um recorte da vida a dois foi contado em letra e música, ao cantar os planos para a manhã seguinte a uma noite bem amorosa. Um dado curioso: especulou-se que a canção erótica deste 1978 se chamaria Motel. Mas, certamente, este título e a delicadeza com a qual ficou a canção ficaram bem melhores. Ao final dela, Roberto cantarola um trecho de Os seus botões, canção sensual que tinha sido lançada dois anos antes.

Segue a letra! Na foto, Roberto Carlos, caracterizado de palhaço em foto para a revista Veja.

Abraços a todos, Vinícius.

CAFÉ DA MANHÃ - Roberto e Erasmo

Amanhã de manhã
Vou pedir o café pra nós dois
Te fazer um carinho e depois
Te envolver em meus braços

E em meus abraços
Na desordem do quarto esperar
Lentamente você despertar
E te amar na manhã

Amanhã de manhã
Nossa chama outra vez tão acesa
E o café esfriando na mesa
Esquecemos de tudo

Sem me importar
Com o tempo correndo lá fora
Amanhã nosso amor não tem hora
Vou ficar por aqui

Pensando bem
Amanhã eu nem vou trabalhar
Além do mais
Temos tantas razões pra ficar

Amanhã de amanhã
Eu não quero nenhum compromisso
Tanto tempo esperamos por isso
Desfrutemos de tudo

Quando mais tarde
Nos lembrarmos de abrir a cortina
Já é noite e o dia termina
Vou pedir o jantar

Quando mais tarde
Nos lembrarmos de abrir a cortina
Já é noite e o dia termina
Vou pedir o jantar...
Vou pedir o jantar...

Nos lençóis macios amantes se dão
Travesseiros soltos, roupas pelo chão
Braços que se abraçam, bocas que murmuram
Palavras de amor enquanto se procuram...

Nenhum comentário: